CARTAS DE SAUDADE (fragmento II)
Querida,
quantos ponteiros me induzirei a retardar nos relógios da minha persistente memória, desde a última vez em que sonhei com a imagem tua pairada no meu sonho lúcido de menino despido?
Mais ainda: quantos grãos de areia haveriam de subir contra a gravidade desta ampuleta velha, desde a última vez em que os meus olhos tocaram o teu riso ocular — sem boca, sem dentes, e com tanta alma?
A memória, ingentilmente, intensifica os espaços vãos, não ocupados, enquanto as ausências transbordam de tempo transcorrido.
A consciência-germe do que tu foste é perfume que coexiste ao ar... é chama sem combustível neste mundo.
(GONDIM, Kélisson. Cartas de saudade. In: Contos e Relatos: a origem perdida do/s Eu/s. 2013. FRAGMENTO)