cartaS.
cartaS.
00:45
Hilda Hilst uma vez disse que existe um pouco de nós em todas as coisas que escrevemos. Talvez pelo desespero de querermos sentir que somos compreendidos por alguém. Lá no fundo deve existir o medo de ser só.
Te li em um momento de angústia, suas palavras penetraram o meu ser, me fizeram refletir e me alimentaram por horas, dias, semanas, meses e anos. Foi o mais próximo que alguém já chegou de mim.
Te fiz minha amiga em segredo, as vezes quero te contar como o pôr do sol fica lindo olhando por cima dos muros do cemitério perto de onde moro, estranhamente é apenas nesse lugar que se vê tal beleza.
Lembro-me quando você disse que não confiava em quase ninguém. Eu realmente não sei o quanto a vida te tirou, mas sei que doeu. Não podemos mudar o que já foi, nos resta apenas seguir, e quanto mais o tempo passa, mais pesado o fardo será, pois carregaremos até o fim de nossa existência tudo o que nos feriu, as consequências das decisões que tomamos, e principalmente a saudade de pessoas e momentos. Essa sim é a pior. O mais pesado dos fardos.
Ao invés de laranja, uso verde limão, mas não para combinar com algum sentimento positivo que me falta, e sim para lembrar-me de ter esperança em tempos de escassez de algum sentimento positivo nos outros e ás vezes em mim.
O meu pai me disse uma vez, que Deus nos fez para andarmos em par, mas que sozinho também não é má ideia. Apenas os que olham com os olhos do coração são capazes de passarem a vida toda acompanhados mesmo que pareçam estar na mais profunda solidão.
Alguns dos meus cantores e escritores favoritos são do nordeste, inclusive meu bisavô Francisco que morreu nos anos 70, mas seu jeito calado e observador, suas roupas brancas e seu chapéu de palha são lembrados até hoje. O som da sua risada permanece viva em meu pai, segundo minha vó.
Por se mostrar tanto em suas palavras, sentir-me segura para me mostrar também.
Desejo um dia preparar-te um café e contar-te tudo.
É certo que nos veremos.