Carta para minha avó
A mulher que sou hoje devo a ti! Nunca te esquecerei, à noitinha, sentada na calçada contando história para a meninada e das tantas vezes que tu compraste os “romanços” para que eu lesse para ti. Tu não sabias ler a palavra escrita, mas sabia ler o mundo e eu fui privilegiada por poder crescer em meio a literatura de cordel, as histórias e outras leituras.
Ah, vó, como esquecerei os bolinhos fritos de arroz, o beiju, o cuscuz e o café pretinho que tu fazias para vender no mercado, onde eu merendava antes de ir à escola do seu Marcelino?
A felicidade, na minha infância. era medida pelas mangas colhidas no teu quintal, pelo café quentinho com bolinho frito de arroz. Vó, a vida era boa e lenta! Nas noites de luar, a fogueira, a macaxeira assada, a brincadeiras de roda, a prosa descontraída... A vida em Santa Luzia com uma porção de coisas que eu não entendia...e agora as entendo tanto que
meu verso é um cofo
de devaneios
é a cesta da vó Neném
levando beiju e
esperança
é o cabelo branco
debaixo do torço
que conta histórias de Trancoso
é a calçada de redondilha
cantada na boca
da meninada
não aprendi fazer versos
de ricas imagens
pouco conheço
da teoria literária
meu verso nasce desajeitado
só que ele
nasce com alma.
Meu verso nasce com a tua alma, vó!