Carta ao Manuel Maria de REMOL - 22 - "Os bisavós"
Manuel, fazes memória inclusivamente
de feitos e convivências em que não participastes,
só através da memória dos familiares que sim
conheceste ... "Sempre penso nos bisavôs, que eu
não conheci. Penso como seriam
as barbas branquíssimas de Xan
e lembro as muletas de Vicenta
com que joguei de neno. Penso nos
seus afãs de labregos singelos
e honrados, nos seus filhos casados
que se juntavam, pela Santa Isabel,
na velha casa petrucial, a falar
à hora do jantar, depois da missa
em honra de São João e da patroa,
de malhas e de esfolhas, de seituras
de rogas, de esfendas e estivadas,
das doenças dos porcos e das vacas,
do trabalhoso que é cultivar o linho,
do que choveu, das sementeiras,
do caros que vão os alugados,
do exigentes que são os jornaleiros,
da suba dos trabucos, de que
os foros são uma injustiça ...
Os filhos dos tios avôs andariam
entrementes - como eu andei
de pequeno - brincando pela eira,
pela palheira correndo na procura das
canas do foguetes: seus pais
pondo seriedade nas palavras [...] (pp. 50-51)
Versas essas vivências tuas doutros
e eu, prudente, apenas quis citá-las
como tu, Manuel, no-las contas.