Carta para Jana, o retorno...
Querida Jana, que estejam bem. Friozinho aqui em Porto, não daqueles frios de “renguear cusco”, mas suportável. Acendemos o fogãozinho de ferro lá da área, coisa mais nostálgica, ecológica e acolhedora. Bom demais, a casa ficou tomada por uma aura de enternecimento, um bucolismo impressionante, pensei até ter visto gnomos pelo ar. Mas nem tudo é perfeito e cheio de borboletas e passarinhos, o aconchego da atmosfera que criamos foi se transformando, tomando vulto, o cheiro da lenha empesteou tudo, passei a rosnar de tão braba. Deu pro bucolismo, “garrei” nojo, vou ter que lavar as cortinas, certamente, xingando e me debulhando em um mar de lágrimas. Jana, a casa virou uma oca lá do meio do Xingu, só faltaram os "Comanches", o cheiro se empoderou, vinha em ondas, o que me deixou de certa forma muito p da cara. Eu rosnava para o fogão, já não me sinto muito ecológica, te confesso. Cheguei à conclusão que odeio fogõezinhos de ferro.
Entre frios que nunca terminam e primaveras sem noções, campeiam as comemorações de Nossa Senhora e do dia da criança, dois eventos que me remetem a ti. As palavras de ordem, hoje, podem ser carinho e doação. Em ti, vejo a luz da maternidade, a arte do teu amor, bom é o teu riso alegre, mesmo no tremer do mundo. Sempre vais ser a pequeninha que – de tão manhosa – começou a falar um pouco tarde, a mas conquistou o dom do verbo. Hoje li o texto de um querido escritor falando sobre grandes mulheres, é o teu caso. Acho que sou a tia mais orgulhosa que existe, tenho jóias. De todas as grandes mulheres que tu és, nem sei quem admiro mais, se a mãe, a cantora de voz linda, se é aquela estudiosa que leva a cura à mente dos desesperados, se à que distribui compaixão às crianças doentes (minha mima, “palhacinha da alegria”), se é que espalha a fé e caridade de Kardec aos aflitos do mundo. Querida e incansável guria. Jana, agora um pedido, um dia quando eu me for, tu me doutrinas, não me deixa ficar louqueando a vida dos outros, fico preocupada, pois sei que do outro lado não tem Coca, na doutrinação, enfatiza isto, fala assim; “– Minha irmã, sai deste corpo que não te pertence mais, aí não tem Coca-Cola, aí não tem refri, segue a luz!”, mas tu tens que insistir, sei que a peleia vai ser dura, te puxa nas “doutrina”.
Os teus pais vieram aqui esta semana, o teu pai beijou o tio e eu fiquei em alas, ele é meio destrambelhado como eu, a máscara dele estava na altura da glote, senti minha pressão em 24 por 30, minhas orelhas ferviam, quase tive náuseas, tremores, sudorese nas mãos, minha bílis gotejava, mas não deu nada, logo me recuperei, numa próxima vez vou fazer o teu pai engolir a máscara. Nem pude xingar o teu pai, a manifestação de afeto e saudade foi tão grande, que logo a minha angústia passou. Jana, odeio este vírus e fogõezinhos de ferro.
No mais, é isto, mima, foi a forma que achei de lembrar o dia da criança, da criança que há em ti e que não deve crescer.
Saudade! Saúde a todos, em especial, às pimpolhas! Beija o doutor por nós. Beijo nosso! Carinho! Maria