Monólogo
Não há muita coisa que eu possa dizer que soe como uma grande novidade no meu repertório de relatos de uma paixão não correspondida. São frases comuns, que definem um momento comum na vida de seres humanos capacitados com a vantagem/desvantagem de sentir.
Mas ainda que seja apenas um monólogo sem ouvinte, onde sentimentos se revelam acumulados e prestes a causar uma implosão, espero com isso tirar um grande peso de meus ombros.
Sempre tive noção de que o caminho que trilhava era instável. A todo momento, quando andei sobre uma corda bamba e soube que cada esperança diminuía as chances de equilíbrio, olhei as coisas sob um ponto de vista parcialmente racional. Discuti comigo mesma, tal qual o texto que escrevo, diversas vezes e insisti que esse lado racional deveria ser escutado. Porque, afinal, a racionalidade descrevia exatamente aquilo que agora vejo com certeza: não há futuro na manutenção desse sentimento.
Você é uma pessoa complexa e acho que essa foi a principal característica que me fez cair de cabeça. Certas complexidades podem ser viciantes. Seus discursos carregavam uma inteligência um tanto maníaca, mas atraente. Suas palavras demonstravam a rapidez de um raciocínio inteligente. E, claro, seus olhos eram bonitos.
Eu me vi presa à todas essas características. A cada discussão que tínhamos, provavelmente mais significativas para mim que para você, eu sentia as algemas ficarem mais apertadas e desconfortáveis. Elas estavam ligadas à correntes pesadas, que eu precisava carregar comigo para todos os lados. Elas arrastavam no chão e produziam um som irritante, a cada mínimo movimento. Doía vê-las ali. Eu me sentia impotente.
Hoje, se olho para trás e repasso tudo o que aconteceu, percebo que as algemas não estavam fechadas em meus pulsos. Com dedos cerrados e vermelhos de tanta pressão, eu estava segurando os grilhões com teimosia e insensatez. O peso que arrastei comigo, poderia tê-lo abandonado há tempos. Não seria uma decisão de fácil execução, as recaídas provavelmente seriam inúmeras, mas pelo menos o passo que estou dando hoje teria sido dado há muito mais tempo.
Talvez, se o tivesse feito, ainda não me pegaria tentando solucionar os diversos enigmas que você instalou em minha mente. Não estaria tão viciada em tentar desvendar o mistério que você é. Porque é isso que você é: um grande quebra-cabeça que ainda não fui capaz de montar. As peças que possuo não se encaixam, ainda que você tenha, recentemente, me fornecido novas. Talvez elas nunca se encaixem. Sua aleatoriedade é prevalecente demais.
E acho que está tudo bem em abandonar um mistério inacabado. Não, não será uma decisão de fácil execução. A vontade de voltar atrás e tentar pela milésima última vez irá surgir novamente. Sim, irá. Mas eu estou começando a andar em outra direção, desviando do caminho turbulento que segui durante todo esse tempo.
Estou deixando para trás um sentimento que quase me matou lentamente e tudo bem. Estou colocando um ponto final nisso.