Um Professor Angustiado.
À Excelentíssima Secretária de Educação
Sra. Dolores Miranda
Estimada senhora,
Por meio deste contato, fazendo jus ao rigor do meu caráter, saúdo-a com benesses e com o respeito peculiar de tão longa data. A motivação das minhas palavras encontra-se na mais genuína das preocupações e, ao passo da exposição, colocarei à prova a decisão de por ela atuar buscando o consolo da sua sempre presente compreensão.
De fato, sinto-me fragilizado. Seis meses longe da escola foi o bastante para eu travar confrontos memoráveis com todos os meus fantasmas. Eles, insistentes até os últimos suspiros, me infernizam e teimam em me lembrar sobre o quão pequeno sou. Dúvidas povoam minha mente. Como se dará a volta às aulas? Teremos protocolos seguros para tal? Como recuperar a conexão com os alunos depois de uma quarentena exaustiva? Bem, essas só são algumas indagações carregadas no meu âmago.
Reconheço, logicamente, meu estado vantajoso em comparação com os demais atores da educação. Os alunos, por exemplo, de certo, estão vivendo situações bem mais complexas, com lares destruídos, falta de alimentos, violência doméstica e tantas outras mazelas. Empatizo-me com eles, garanto. No entanto, pensar assim, infelizmente, não tem surtido efeito para vencer os temores.
Sinto-me como se fosse um barco à deriva, ao sabor das águas, ora calmas, ora revoltas. Há quem acredite na força do destino regendo todas as coisas e acontecimentos. Rechaço o pensamento. Não por descrédito, mas sim por ser um inconformado por natureza e ter a ideia fixa de protagonismo à minha própria vida. Nesse momento, sou um mero coadjuvante, cheio de medos e incertezas.
Talvez a senhora esteja pensando que tudo isso pouco sentido faz, afinal os professores e coordenadores da rede continuam com formações online visando, justamente, trabalhar o acolhimento em tempos de pandemia. É verdade, e friso a importância desses momentos. Sem eles, o panorama mental estaria ainda mais comprometido. Entretanto, ao menos para mim, é insuficiente frente a meu quadro.
Isso posto, e por não enxergar mais medidas a serem tomadas de maior impacto, me vejo na obrigação de renunciar a meu posto. A decisão é monocrática e baseia somente em sentimentos conflitantes os quais me governam nesse instante. Atesto, diga-se, sobre as providências exitosas tomadas pela senhora. Aliás, dentro das condições impostas, sua atuação foi belíssima. O problema não está aí, e sim aqui, comigo.
Refleti muito acerca dessa escolha. Penso na assertividade da mesma. Vejo meus colegas, nas suas respectivas escolas, anunciando as maravilhosas ações empreendidas e os resultados alcançados. A experiência no ramo me diz que tal cenário é inverossímil. Sustenta-se no autoengano como premissa para se manter em destaque e preservar o cargo. Prefiro seguir numa outra estrada; a qual me garanta colher implicações verdadeiras. Depois dos trinta, a gente não se permite certas coisas, mentira em uma dessas.
Mantendo-me fiel aos meus princípios, me demito. É inútil ficar por ficar, como me conhece. Me apetece muito mais ser eu mesmo e contribuir cem por cento nos meus projetos. A pandemia ressignificou muitas coisas e o mais belo disso é você se reconhecer modificado dentro do processo, pois jamais seremos como outrora fomos. E quer saber? Prefiro meu novo eu constituído nesse período, mesmo com todos os traumas.
Me despeço, não sem antes agradecer. A senhora, meu muito obrigado pela parceria firmada nesse tempo. Saiba que para mim foi de grande valia e de imensurável crescimento profissional. Faço votos de sucesso hoje e sempre. Ao término dessa jornada, saio como uma águia e nada parecida com o passarinho de anos antes que fui.
Com muito afeto e respeito,
Eliseu Nunes.
À Excelentíssima Secretária de Educação
Sra. Dolores Miranda
Estimada senhora,
Por meio deste contato, fazendo jus ao rigor do meu caráter, saúdo-a com benesses e com o respeito peculiar de tão longa data. A motivação das minhas palavras encontra-se na mais genuína das preocupações e, ao passo da exposição, colocarei à prova a decisão de por ela atuar buscando o consolo da sua sempre presente compreensão.
De fato, sinto-me fragilizado. Seis meses longe da escola foi o bastante para eu travar confrontos memoráveis com todos os meus fantasmas. Eles, insistentes até os últimos suspiros, me infernizam e teimam em me lembrar sobre o quão pequeno sou. Dúvidas povoam minha mente. Como se dará a volta às aulas? Teremos protocolos seguros para tal? Como recuperar a conexão com os alunos depois de uma quarentena exaustiva? Bem, essas só são algumas indagações carregadas no meu âmago.
Reconheço, logicamente, meu estado vantajoso em comparação com os demais atores da educação. Os alunos, por exemplo, de certo, estão vivendo situações bem mais complexas, com lares destruídos, falta de alimentos, violência doméstica e tantas outras mazelas. Empatizo-me com eles, garanto. No entanto, pensar assim, infelizmente, não tem surtido efeito para vencer os temores.
Sinto-me como se fosse um barco à deriva, ao sabor das águas, ora calmas, ora revoltas. Há quem acredite na força do destino regendo todas as coisas e acontecimentos. Rechaço o pensamento. Não por descrédito, mas sim por ser um inconformado por natureza e ter a ideia fixa de protagonismo à minha própria vida. Nesse momento, sou um mero coadjuvante, cheio de medos e incertezas.
Talvez a senhora esteja pensando que tudo isso pouco sentido faz, afinal os professores e coordenadores da rede continuam com formações online visando, justamente, trabalhar o acolhimento em tempos de pandemia. É verdade, e friso a importância desses momentos. Sem eles, o panorama mental estaria ainda mais comprometido. Entretanto, ao menos para mim, é insuficiente frente a meu quadro.
Isso posto, e por não enxergar mais medidas a serem tomadas de maior impacto, me vejo na obrigação de renunciar a meu posto. A decisão é monocrática e baseia somente em sentimentos conflitantes os quais me governam nesse instante. Atesto, diga-se, sobre as providências exitosas tomadas pela senhora. Aliás, dentro das condições impostas, sua atuação foi belíssima. O problema não está aí, e sim aqui, comigo.
Refleti muito acerca dessa escolha. Penso na assertividade da mesma. Vejo meus colegas, nas suas respectivas escolas, anunciando as maravilhosas ações empreendidas e os resultados alcançados. A experiência no ramo me diz que tal cenário é inverossímil. Sustenta-se no autoengano como premissa para se manter em destaque e preservar o cargo. Prefiro seguir numa outra estrada; a qual me garanta colher implicações verdadeiras. Depois dos trinta, a gente não se permite certas coisas, mentira em uma dessas.
Mantendo-me fiel aos meus princípios, me demito. É inútil ficar por ficar, como me conhece. Me apetece muito mais ser eu mesmo e contribuir cem por cento nos meus projetos. A pandemia ressignificou muitas coisas e o mais belo disso é você se reconhecer modificado dentro do processo, pois jamais seremos como outrora fomos. E quer saber? Prefiro meu novo eu constituído nesse período, mesmo com todos os traumas.
Me despeço, não sem antes agradecer. A senhora, meu muito obrigado pela parceria firmada nesse tempo. Saiba que para mim foi de grande valia e de imensurável crescimento profissional. Faço votos de sucesso hoje e sempre. Ao término dessa jornada, saio como uma águia e nada parecida com o passarinho de anos antes que fui.
Com muito afeto e respeito,
Eliseu Nunes.
Campos do Jordão, 01 de Outubro de 2020