Cartas de um soldado de guerra p/2

Minha querida

A cada dia que passa, eu acredito cada vez menos na esperança para a humanidade.

Nossa última missão, na qual escavaríamos um túnel por baixo de uma riacho, foi sabotada por um espião infiltrado no nosso esquadrão.

Ele implantou bombas dentro do túnel e ficamos presos a uns sessenta metros de profundidade, do outro lado do rio e bem abaixo do inimigo.

Não nos restava outra opção a não ser continuar, pois se voltássemos o rio inundaria o túnel.

Contávamos com recursos escassos para nossa sobrevivência e com apenas três pás, mas eu e meus sete comandados resolvemos continuar com o túnel, pois era a única opção, embora sabíamos que o inimigo nos aguardava.

Foram quinze dias tortuosos, a cada metro que avançávamos nós perdíamos um e meio, não tinha onde colocar a terra, a não ser atrás de nós.

Foram longos turnos de até 16hs com dois grupos de três e eu, bem... eu não podia descansar mais que 3hs pois era o tenente no comando além de revezar com os escavadores. A sensação claustrofóbica e o calor eram insuportáveis, e a arma no meio coldre parecia querer se comunicar comigo.

No décimo quinto dia resolvemos tirar uma folga, pois o cansaço era impiedoso, eu sentei um pouco e fechei os olhos, meus pensamentos foram rapidamente tomados pelo dia em que nos conhecemos. Você estava tão linda naquele baile com aquele vestido azul e sapatos brancos, que não resisti e tive que chamá-la para uma dança.

Quando eu me aproximei de você o meu sonho estava se desfazendo, como se estivesse derretendo, então eu corri e tentei segura-lá pela mão, e senti que tinha lhe tocado, mas você se desfez como areia e tudo ficou escuro.

Eu escutava vozes e gritos de agonia e dor, ao procurar a origem dos sons vi meus companheiros sendo alguns fuzilados, outros sendo desmembrados, amarrados com cordas a uma carro, e o meu castigo? Vê-los morrer um por um.

Eu percebi que a mesma mão que eu estendi na sua direção e senti que tinha lhe tocado estava a minha arma a me chamar com apenas uma bala. Ela falava comigo com uma voz doce, uma voz que se aproximava cada vez mais do meu ouvido sussurrando, Meu Deus! Que voz maravilhosa que bala mais deliciosa. Ao perceber estava com a arma apontada para a minha cabeça, e eu não queria tirar ela dali, era tão fácil, tão simples, parecia ser a solução, e foi quando voltei a ouvir sua voz que me dizia “só resta mais uma batalha meu amor, LUTE!”. De repete acordei, voltei a tona e joguei a arma longe e num ataque de fúria voltei a cavar sozinho.

Ao ouvirem os gritos meus companheiros se encheram de moral e coragem e vieram me ajudar. Depois de 4 horas a pá bateu em uma raiz de carvalho, era a recompensa que nós merecíamos. Os sorrisos e a alegria estavam em nossos corações novamente e eu apaguei de tão cansado...