Confronto unilateral
Perdoe-me, impaciente, se tenho passado por teus ditos com desprezo ou desgosto! Ando tão cheio das coisas das quais não consigo me preencher, que nem ao menos me dou conta do quanto me falta pra que me façam transbordar de vez.
Vai!!!
Novamente peço: perdoe-me, impaciente e imediatista! O momento de eu me entregar não bate à porta, pois nenhuma chegada tua me convenceu. Não me convém ceder apenas por me sentir culpado de te ter, sempre tu, à minha inteira disponibilidade. Isso não me serve. Escolho seguir verbalizando que fico excedido de tuas cargas que tanto me pesam e nada aliviam.
Não!
Pensando muito e melhor, não me perdoe, ser hipócrita! Não me perdoe nem me invada. Que buscas em mim, se sou eu tão ilegível e incalculável? Pras suas leituras e matemáticas, serei sempre papel em branco e número zero. E aqui não se pode escrever, não se pode desenhar nem brincar de exibir aritmética. Aqui não se pode nada! O único que se permite é não ultrapassar.
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NOTAS DO AUTOR:
* O título revela o completo poder do "eu lírico" de decidir como será o seu confronto com o outro, que é quase vítima.
* A palavra IMEDIATISTA certa vez me foi atribuída segundos antes do término de uma ligação. De certo modo, ela ainda me está rodeando os ouvidos, buscando jeito de sair ou entrar de vez no meu entendimento e aceitação.
* A palavra VAI tanto afasta quanto chama para a reflexão. Posso dizer: "Vai! Não te desejo mais aqui!"; mas também posso dizer: "Vai, eu sei que você me entende... Deixe-me ficar!".