NO DIA MUNDIAL DA TERRA 2020

«Missiva a Lucy Bream e a todos os artistas de boa vontade»

Lisboa, 22 de Abril de 2020

Não, minha caríssima amiga, nesta Missiva – que tenciono fazer substituir a um Poema sobre a nossa Mãe Terra – não, não quero acreditar que no seu seio sublime coabitem seres humanos – que se consideram verdadeiros artistas – que não tenham a consciência e a humildade da sua própria limitação! E não estranho, pode crer, pois que toda a História da Cultura e da Arte o tem testemunhado desde, sei lá, desde o tempo do primeiro homo sapiens.

Não estranho porque desde que se iniciou a revolução do Homo Faber – nomeadamente desde os primórdios da Mãe-Escrita – que se tem mantido o perene fenómeno do processo produtivo e da substância identitária;

Não estranho porque – e não há testemunhos fechados (vulgo “reino do umbigo”) – o que mais incomoda o espírito do homo historicus é a sua apetência para o controlo do território que tem ao seu redor;

Não estranho porque está precisamente aqui o cerne de todo o sonho ilimitado do génio humano: exercer o poder de influência sobre esse mesmo território.

Neste mesmo contexto tornam-se imperativas duas questões fundamentais: onde se colocará – se é permitida esta ousadia – o sentido da liberdade e, já agora, qual o papel da criatividade?

Isto levar-nos-ia infatigavelmente, por caminhos ínvios e sinuosos, a calcorrear montes e vales, planícies e desfiladeiros… até que se revelasse em todos nós, precisamente, uma só identidade: a Arte.

Chegados aqui, pretendo realçar este binómio crucial humanista, sem o qual a Arte jamais pode ser concebida: a liberdade e a criatividade. E mais se justifica este corolário neste dia – Dia Mundial da Terra – o qual estamos celebrando, desde há dois meses a esta parte, praticamente sem caminho aberto para qualquer modus operandi…

Porque temos condicionada (por confinamento sanitário) a nossa liberdade; porque não há lugar para a criatividade (por falta de discernimento e lucidez). O que sentiria a Mãe-Terra se o mesmo se passasse com ela própria? Estaria, com certeza, em causa o seu digno lugar no Universo!

Mas, perguntar-me-á a minha amiga e todos os bons artistas (os de boa vontade nomeadamente) a que propósito vem todo este arrazoado discursivo?

Por este simples e justo PROPÓSITO: aferir sobre o nosso estatuto de seres humanos pensantes e sensíveis. Pensantes, pois acreditamos estar aqui o nosso privilégio vital; sensíveis, pois quem senão nós – os seres humanos – deverá assumir a distinta alma existencial: a sensibilidade. É este o meu consciente desiderato, minha amiga.

O nome de minha amiga – Lucy, de Luzia, creio eu – aponta precisamente para que tenha em si uma alta carga de clarividência e de luz: condição primordial para se ser verdadeiramente artista. Este – o ARTISTA – tem na clarividência e na luz os melhores combustíveis para chegar à Obra. Daí que liberdade e criatividade estão permanentemente activos no seu caminhar.

Tomara que, neste Dia da Terra, todos os seres humanos fossem artistas! E, como pensantes que somos, já lá vai meio século em que a grande tarefa a ter em conta tem sido “alertar para os cuidados a ter com esta Casa que é de todos nós”. Para isso a principal bandeira que devemos sempre hastear é tão só: a sensibilidade.

Quanto a mim, todos nós temos de nos iluminar uns aos outros; pois todos, mas todos mesmo, aprendemos uns com os outros, aceitando, com certeza, a humildade cultural a que isso impõe.

Entra aqui, a talho de foice, o dever e a importância decisiva do testemunho. Lembro a mensagem humanista que Jorge de Sena teve a hombridade de nos deixar: "Ninguém tem o monopólio das formas e dos conteúdos. Todos nos completamos!”.

Termino precisamente com o sentido desta mensagem: Isto é Arte, Poesia, Cultura. Isto é Humanismo!

E, se assim é, compete-nos a nós artistas, poetas, professores, educadores assumir a distinta tarefa de promover e valorizar a Terra.

Professor e poeta Francisco de Assis / Frassino Machado

In OS CAMINHOS DO PENSAR

FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 22/04/2020
Reeditado em 22/04/2020
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