SAUDADES
SAUDADES
A saudade que me corrói
Que me leva e me traz
A saudade que me alimenta a alma, a escrita, a veia
O amor, o amor este que me esguia o sangue e o suga até ao tutano….
Esta coisa do certo e errado
Do estar entre quatro paredes, do viver sem cores e entre cem cores que a solidão inventa
Longe dos que amo, perto das estrelas da minha vida, mas que continua sem ser auto-suficiente porque me faz falta o que me dá luz à vida, me rega a terra.
Continua a encher-me o coração, o perto, o tato.
O toque, o grande amor que me faz caminhar e dá sentido à vida, que me faz voltar a casa….
Sinto-me só, sinto-me vazia, sinto-me acordar num pesadelo
Pesadelo todos os dias iguais aqueles que não volto a casa.
Sinto a vossa falta porra, das gargalhadas sonoras agarradas ao bom do abraço e ao beijo certo e incerto, ao tilintar dos copos do vinho, às confidencias sonoras diretas, olhos nos olhos entre risos e lágrimas, sinto a vossa falta, das lágrimas nos ombros, das jantaradas, das garrafas despejadas à ultima gota, do ultimo cigarro da madrugada, agarrados às beatas, do último abraço às quatro da manha na sala de jantar, da despedida, do toque, do olhar, do sorriso, do amor que a amizade e lealdade trás .
É incrível o que a solidão nos trás, traz-me a incomensurável saudade de vos ter por perto
A Marta que me foi arrancada à força da vida como um bocado de carne nos é arrancado da pele do corpo, em formato de rasgão e sem curativo, ferida aberta para sempre…
Às minhas pessoas que descobri mais do que sabia que me estavam tatuados na pele e que faziam um verdadeiro vácuo na vida.
Sinto a falta, do cheiro dos cabelos, dos ombros, falta do beijo, da pele e da carne, dos jardins imensos que as palavras nos olhos nos deixam, no sabor das coisas.
Dos telefonemas de uma hora pelas 23 h a desabafar o que ninguém sabe nada
“Dá-me mar no meu rio
Na minha estrada
Vou deixar-te na minha estrada “
Hoje descobri dezoito anos depois, na vista do terceiro andar que o amor da minha vida estava lá em baixo, e que era um bocadinho meu… lindo… O amor da minha vida que partilha as mesmas quatro paredes do que eu estava ali, e está aqui a partilhar um pouco do que nos sobra da cama , do que nos deixam que sobre de nós, e isso, meus caros, isso é amor, é um amor perdido e encontrado nas revezes do tempo, e que tivemos algo que nos fez cruzar, ou pior fez-nos tropeçar nisto que deu em amor, história e filhos, tempo que nos sobra que nos consegue tropeçar e cair entre lençóis e descobrir que ironicamente afinal existe algo que nos liga apenas os dois, foge ao rumo do grito, da apaixonante secreta vida a dois porque hoje somos cinco e a multiplicação fez com que morresse tanto de nós, mas existe ainda uma luz que neles brilha e em nós nasceu.
Não podemos sair, dizem!
Saímos daqui sem sair de casa, obrigo, um mês em casa, saímos à procura da luz solar, daquilo que brilha mais em nós, daquilo que nos colocou num abrigo total de proteger os nossos.
Tenho saudades vossas porque tenho memorias nossas
Sou recheada sem fundo, uma garrafa de Cartuxa que não tem fim, de um mundo aonde não existe uma palavra que diga sem fim.
Bom e, como não podia deixar de ser,
Marta,
Que porra é esta que nos deixaste anos depois?
Esta puta de margem que não te ouve e com certeza não me ouves deste lado.
A amiga que não chorou três dias, e ao final dos mesmo numa banheira qualquer chorou baba e ranho porque percebeu que não voltavas, a outra que ainda hoje me diz que em qualquer olhar ou gargalhada minha a ouve, outra via Madrid que cada vez que falamos ao telefone se recorda da voz “ velhaca”, a outra que celebra o 14 Março como celebração de amor, mais um, via Angola talvez o mais importante de todos que celebra os dias 7 como os anos que “estão“ casados, e estupidamente eu, que ainda choro, que ainda ligo o teu numero para ouvir voice-mail com a tua voz dez anos depois, isto é uma merda Marta.
A mãe continua a chorar o dia de anos em Março, o dia da queda 8 em Outubro, o dia da morte e o natal como se tivesses ali, e estás nas fotografias, nas unhas, no cheiro, na memória e no passado, qual rasgo de carne, crosta sem curativo, ferida aberta que sangra sempre, e por vezes odeio-te por isso, porque foste e mesmo assim estás sempre, sempre como alguém e eu procuramos sempre e nem sempre acordamos em nós, como malandra escondida nos armários mais fechados sempre.
Conheço agora as vizinhas que bebem um copo de vinho à janela e me brindam quando até à data nem sabiam quem eram, sei hoje que o vizinho do segundo andar faz ginástica à tarde, passeia ao final do dia, e arranca as plantas, atirando cá para baixo a podridão, vejo que os do prédio da frente andam loucos com as limpezas, vidros, rodapés, e que os do último andar cantam e dançam que nem loucos pela 22h, honra à medicina, e eu confesso que é o meu momento zen, que me liberto.
E eu agarro-me ao que escrevo, meia garrafa abaixo, sem vergonhas, sem filtros, com ou sem erros ortográfico e atiro para onde me apetece.
Porque sinceramente estou bem nas tintas para o que pensam, para o que sintam, porque hoje o que me importa é o que eu sinto.
Hoje quero-vos falar de mim, fui um verdadeiro Gustavo, agarrado as saias da minha mãe, como se fosse o ultimo pacote de pipocas do mundo, lembro-me de rachar a cabeça numa quina da cozinha num triciclo platinado e parar a chamada telefónica da minha mãe em gritos, tal e qual o meu filho, para a ter só para mim, recordo-me de ir com ela correr os corredores do supermercado da TAP e ser a sua maior companhia, de fazer inúmeras peças de teatro nos seus jantares e chamar mãe e pai a todos os seus amigos, primeiro porque os amava, segundo porque adorava ser a preferida deles.
A primeira mãe que chamei era a cabo Verdiana celina Pereira, porque me perdia nos olhos verdes dela.
Eu era a pequena atriz que ali estava
Recitava, dançava e não deixava viver o mundo adulto.
Um dia disse à minha mãe que não a queria acompanhar, e ela teve a certeza que eu já tinha saído de cena.
E eu, de facto fui, não sei para onde fui, cresci, refleti-me na loucura das mais velhas e no fetiche de ser crescido, apaixonei-me perdidamente, e queria esse mundo, mas não me levou para além de troia, volto-me a apaixonar pela minha infância, descobri que o meu amor era tão infinito, tao cheio que vi a veia das letras, amor este que morreu algures no tempo, porque afinal ninguém pode amar ao dezasseis anos… Mas foram resmas de folhas, escritas a quatro mãos no escritório do meu pai, que mesmo na outra margem estava sempre ali, no triciclo, no super, nas saias largadas, na adolescência de jarros de café, nas experiências e em muito, muito choro.
Eu acreditava na ideia, no sonho, a alma gémea, na lua, do supra suma da vida, na preguiça do amor e uma cabana, até nascer o primeiro, e eu vi no espelho o que fui, o que era, e que eu só entendi quando te conheci.
Conheci-te com vinte e seis anos, com um filho de um ano e onze meses, uma criança de vinte um ano, paixão à primeira vista foste um super homem, porque agarrar uma miúda que não fritava um ovo, na faculdade, reticente, meio amada, amargurada, independente, só, é dose. É amor… E passaram quase vinte anos.
A quarentena começa pelas 8h da manha, pequenos almoço, ginástica, yoga trabalhos com o do meio, o diplomata, o sonho, se tivesse a certeza que mais filhos viriam como ele, teria mais cinco, inteligência nível 10, esperteza 0, diplomata, melhor compincha, amigo, de sonho a menina que sonhamos, registado como tal, mas UPS, um belo rapaz, de sonho, igual ao pai.
Pelas 9h, acorda o mini me, igual à mãe em tudo, ginástica 24 sob 24h, teatral, magricela, esticadinho, copia, terror, ginástica que não é preciso, yoga que destrói ao final de 2 minutos, mantras que não duram 2 minutos, mas que quando me olha nos olhos, reflete toda a minha historia, vida, e sonhos, e só por isso sei que sua super estima vai morrer na praia sou eu, como onda que vou tentar levantar vagão.
Pelas 13h acorda o rei da casa, quase 20 anos de sonolência, tantas horas de party como eu de escrita, tantas minis e cigarros como eu era de café me jarro e tabaco DG Light és roubado à mãe e virado o filtro….e o mais grave enquanto a mãe escreve, ele bebe e partilha o momento.
saudades de estar com os meus
Querem saber mais?
Sei que aqueles que me amam, não lerão até ao fim, e lamento porque não vão ter oportunidade de nadar até ti Marta, de te ver na outra margem, porque é uma merda , é um facto mas eu tenho sempre a mesma oportunidade porque remo até lá e venho a nado, abraço-te como se não houvesse amanha, abraço-te e conto tudo o que nos separa e supera neste dez anos,
E agora digo, ainda bem que não está aqui, porque és carne, e não cumpririas quarentena nenhuma,
E eu hoje disse depois de um risoto de beterraba, “agarrei-te pelo estômago”?
Tu?
“Nem fritavas nem um ovo…”
E não é que é verdade???
Porque já eras eu… E tu não sabias…