CARTA À MULHER QUE FUI
Olho para você através de uma lembrança embaçada, vejo seus olhos que não foram preparados para a tristeza, o choro, a ferida, o amor partido, o desejo frustrado.
Você acreditava ser feia! Feia triste egoísta
Não sabia pedir perdão nem dizer "eu te amo".
Você não vivia. Era uma apenas uma mulher oprimida. Nunca realizava a própria vontade. Vivia tão presa à conformidade, que se espantava ao ouvir falar que poderia fazer escolhas, como quem ouve um grito de horror na madrugada.
Vivia sufocada, sem conseguir emergir. Você permitiu que a sua vida fosse um acidente de percurso. Não entendia que poderia superar a si mesma, superar a família, a cultura, as normas...
Oh, mulher, não se pode passar a vida toda persistindo em enganos! Não sinta pena de si mesma, não há mais tempo para a autopiedade. Sua alma tem sede.
Contemple-se! Você é uma outra mulher, aquela que deveria ter sido em toda a sua vida e que nunca havia se permitido. Depois de tantos anos, você sorriu e se sentiu inteira.
Você fugiu sem trégua, sedenta, faminta! Você surgiu como quem sai do fosso, deixando para trás toda a sua apatia. Agora, você olha a sua volta com olhar abundante e ambiciona novas experiências. Do seu rosto saltam luzes em forma de lágrimas aliviadas.
Nas ruas, as pessoas olham para você com admiração e abrem-lhe passagem com reverência e você renasce, a cada instante, como uma deusa.