a carta de um filho desconhecido

39 era a idade de vetane, isso não lhe trazia alegria nem tristeza. apenas um sentimento sem explicação.

estava benzido com a vida. ficar ausente de casa por 20 dias, nesta sua ausência tivera cartas na porta da sua casa. sem demora pegou nas cartas, as caligrafias lhe pareciam estranhas, cerca de uma dúzia de páginas na outra carta! pensava ele:

-é contrato de trabalho? será? isso não pode ser. mas isso é um manuscrito do que um contrato.

aquela era uma carta porém sem assinatura muito clara. constava na carta:

-meu bem-amado, a ti que nunca me conheceste, é só a ti que me quero dirigir, é a ti que pela primeira vez direi tudo. se tencionares ficaras conhecendo a minha vida, que sempre te pertenceu.

soube que hoje é teu aniversário, parabéns! deponho um beijo para o senhor. que seja muito feliz.

também sei das suas aflições, necessidades e pobreza extrema, não tenha medo que não é castigo nenhum. queria morrer primeiro, só assim saberias quem eu sou, mas estes segredos são teus. sei que no fundo sabes do que estou a falar.

- se não receber esta carta, é porque terei preferido rasgar. já imaginaste falar com um morto, receber a carta escrita com um morto?

-brincadeiras, até que os mortos não castigam somente protegem-nos. não tenhas medo das minhas palavras, só peço para que creias em tudo que vou-te dizer aqui.

- nasci numa gravidez que pelo visto foi fruto de um estupro ou sem amor. lembras te da pobre menina que tu engravidaste, nós vivíamos que como perdidos na nossa mediocridade. tu nunca soubeste o meu nome!

- todas noites fui obrigado a pensar em ti, e no entanto ainda não te tinha ouvido, muitas vezes fui forçado a adivinhar como seria o teu rosto.

.via te sobre o aspecto de um homem de idade, com óculos e uma grande barba branca. andei muito a roda da tua vida e da tua existência imaginei te como seria, alto ou baixinho, como seria nossos passeadouros, nossas brincadeiras de dois num só corpo. passei toda minha vida te esperando e espreitar se um dia bateria a minha porta.

- tinha tudo para fracassar na minha vida, passei muitos anos preocupado contigo, sempre a espera e em movimento. sem sinal, apenas segredos que estavam inacessíveis.

-como homem que eu sou, penso que nem deveria estar a te grafar isso. não tive nenhuma infância com o meu pai, não conheci-o, cresci sem saber o que era felicidade. numa noite triste perdi meu avô, os homens mataram ele, fiquei traumatizado com isso.

aquele sim foi meu pai, tudo que aproveitei e aprendi com o meu avô, me fez homem. lembro-me da última conversa que tive com ele.

«meu filho seja homem íntegro, trabalhador» disse meu avô numa das estórias repelentes e reais que umdia me contou.

naquela mesma noite vi ele a morrer nas minhas mãos. minha mãe foi sempre dócil a todos os meus desejos.

-terei necessidade de te dizer onde fui educado, como medrei e sobrevivi para chegar a essa idade?

deixei minha mãe e minha avó muito cedo, parti para a sua terra maputo. ver-te uma só vez, encontrar-te uma só vez era o meu único desejo quando cheguei em maputo.

estou imaginando esses 25 anos que passei sem nenhum sinal seu, vivia cativo como uma raposa no seio da comunidade.

sei que nunca fui a coisa alarmada para ti, de mim sempre tiveste informação, mas eu durante estes longos anos te ocultei a minha existência porque não sabia onde te encontrar. falo te hoje porque estas estendido, adormecido nas trevas ou talvez te resta pouco tempo para partir e não voltar mais. não sou nenhuma esperança nem um pesadelo.

- ouvi que fora despejado na sua casa, isso é verdade?

-sinto muito se assim for.

realmente sou um sujeito anónimo nascido fortuitamente por ti infiel, foi abandonado. nunca me reconheci como seu pedaço. sinto que nem a ti próprio te conheces.

sabes! o maior orgulho. queria que pensasses em mim todos os dias, ser o único e primeiro pedaço amável, aquele amor filiar, só nós, somente nós. mas na verdade nunca pensaste em mim.

-sou muito grande sim, não te acuso meu senhor, não te acuso.

a perturbação e confusão saíram nos meus sentidos, já pensaste como seria a sua vida sem a presença da sua mãe? sei que também não conheces o teu.

quando cresci um pouco, captei bons elogios sobre a tua pessoa e sua pulcritude, no fundo sei que és bom e caridoso humano, mas essa sua bondade é totalmente curiosa.

repito, não te acuso.

nunca o meu amor por ti sofreu uma censura da minha parte. foi duro quando ainda criança, mas fui iluminado e percebi a grandiosidade do perdão e a existência de um pai celestial que nos ama.

-amei-te

sempre amei-te. mesmo sem conhecer-te.

aliás nem te exijo que me conheças, o amor paterno é insubstituível. eu atravessaria de novo o inferno deste sofrimento só para não ter sua mágoa.

tenho medo da palavra inferno. não quero ouvir falar dela. realmente existe inferno aqui na terra, eu sofri tanto. desculpe me por te falar essas coisas, é a única vez que te escrevo, nunca mais te falarei sobre isto. durante 25 anos não te dirigi nenhuma palavra. mas pude-te escrever 14 cartas que nunca recebeste porque eu não sabia onde mandar. esta é decima quinta carta, por sorte esta na suas mãos. mas não é a ti que eu acuso. não te acuso, quero te cólera se voltou contra ti mesmo nessa hora em que meu corpo se estremecia com dores nunca te acusei.

ele virou a última folha da carta e, lá vinha escrito:

“meu senhor receba esta generosidade, uma oferta de emprego como director executivo na minha empresa, seu trabalho inicia amanhã, te vejo na empresa com muita alegria”

“ para grandes males, grandes remédios”, tem uma casa disponível para si, passará habitar na próxima semana.

abraço do seu amigo henry.

nota: esta carta faz parte de livro com o titulo: a plebe na agonia de outros pesadelos, em processo de publicacao.

de autoria Syney joao sindique

voce tambem pode participar ajudando a concretizar este sonho de tornar este livro numarealidade. basta que mande uma mensagem no watsapp: +258845546457

Sydney Sindique
Enviado por Sydney Sindique em 18/03/2020
Código do texto: T6890927
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