Desculpas

Desculpe-me a bagunça da casa, parecendo inabitada, com poeira nos móveis, folhas ao chão, coisas espalhadas, mas falta um pedaço do telhado, não tenho onde guardar tanta tranqueira acumulada dos anos vividos. Detesto ficar suada pelo calor que sinto ao fazer faxina. Também não recebo visitas; como sempre disse: somos apenas Deus, os cachorros e eu e para nós, tanto faz, qualquer coisa serve.

Se tenho filhos? Tenho sim, três: duas meninas e um menino e todos cresceram, com sacrifício, estudaram, são inteligentes e belos. Têm suas vidas e parecem estar bem. Busquei criá-los desapegados de mim para que se eu viesse a morrer, não sentissem a minha falta. Acredito que fiz um excelente trabalho, pois são totalmente desapegados, não morri e eles não vêm me ver.

Sempre gostei da solidão, de pôr meus pensamentos em ordem. Primeiro o fazia para fugir das pessoas que, sentia, zombavam de mim ou me criticavam, depois acostumei e fiquei sozinha simplesmente.

Ouço críticas constantes aos meus cachorros, mas houve um tempo em que eles representavam a minha segurança e dos meus filhos pequenos na solidão e abandono de noites sem fim. Acabou se tornando um hábito para manter pessoas mal intencionadas longe e hoje onde moro é área isolada, de risco, e eles exercem seu papel. Tenho consciência que a presença deles afasta pessoas boas também, mas meu histórico de visitas recebidas não é agradável, por isso dispenso.

Também conheço pessoas fantásticas que me querem ajudar, porém não vejo motivo para melhorar a casa: não vou levá-la para onde devo ir. Não há sentido em enfeitá-la se não tenho a quem agradar ou impressionar. Todas essas coisas que aqui existem vão ficar, serão doadas, jogadas, sei lá, pouco importa, pois a maioria não me serve pra nada.

Não entendo tanta preocupação para nada.

Já fui assim: pensava em possuir coisas como casa, carro, equipamentos, móveis e eletrodomésticos de última geração e posso dizer que cheguei quase a até ter tudo isso, mas nada preencheu meus momentos de tristeza, diante dos risos mal disfarçados, das humilhações e tanta ausência. De que adianta possuir bens e não identidade? Saber-se motivo de riso e piadas sem graça?

Nada há de novo a ser vivido. Minha existência não tem utilidade alguma e é só aguardar o apito final.

Cada consciência é uma consciência e não me compete julgar quem quer que seja. A mim bastam os meus dias.

Como acender a luz de um quarto escuro e desconhecido se não se sabe sequer se há alguma lâmpada a ser acesa ou um interruptor que a acenda? Parem de julgar o que desconhecem!

Vá e faça o seu melhor!

Suely Buosi
Enviado por Suely Buosi em 19/01/2020
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