Quem sou eu?
Ondas tenebrosas agitadas pelo vento atormentam a superfície. Entretanto, o centro do oceano permanece imóvel. Quem sou eu? Onde estou? Na superfície ou no centro. O centro não se apega, convicto sobre quem é, não formula opiniões e nada lhe pode ser tirado. A superfície, por outro lado, não tem raiz, acumula opiniões e tem muito medo de perdê-las. Ela se identifica com as coisas e sente-se amputado ou violentado quando mexem nas suas coisas.
Mas o mundo é superfície e eu estou na superfície, pois não respiro dentro d’agua. Sobre as aguas, faço escolhas e me responsabilizo. Ajo e dou causa a efeitos que me causam dor ou prazer. Sou atingido por ventos que cruzam meu caminho sem nenhuma razão aparente. Na superfície. Tenho tendencias inatas e outras adquiridas que me impulsionam a agir e reagir. A sentir e ressentir. Vivo na superfície e aqui convivo com outros iguais tao ou mais loucos.
Durante um desses vendavais em que sou subjugado por expetativas negativas. Onde me sinto amputado pela opinião alheia. Quando me sinto temeroso com a doença que alcança a casca do meu corpo. Durante um desses vendavais, me interiorizo e busco o centro. La no centro sinto-me capaz de abrir mão de tudo que julgo ser e ter. La, sinto-me mergulhado no eterno, sereno, abundante no vazio, no azul anil de um silencio profundo, onde flutuo em camera lenta de onde não quero voltar.
Mas tenho que voltar. Voltar ao vendaval.
Na superfície agora declaro: leve tudo, pois já não tenho nada. Fique com minhas certezas, pois me contento com saber que não sei nada. Estou pronto para morrer para viver na vida eterna.
Termino de escrever e sinto-me mais calmo. O vendaval passou. Mas haverá outros.