CARTA PARA VOCÊ
 
Oi,
 
Por que, depois de tanto tempo, sete anos para ser mais exato, você voltou? O que a levou a querer estar, novamente, próxima a mim? Não acredito que tenha sido a saudade... Saudade não dá depois de tanto tempo. Se tivesse sido a saudade, os anos teriam sido diminuídos, em muito, nessa conta de sete anos. Nem tampouco acredito que tenha sido arrependimento... A gente só se arrepende do que faz quando bate a saudade; portanto, essa hipótese está descartada em virtude da primeira conjectura. Então, o que foi?

Uma coisa é certa: pegou-me de surpresa. E, contrariando os meus valores, eu resolvi conversar com você. Resolvi lhe dar um alô também. Talvez em mim a saudade tenha sido companheira constante nesses anos todos. Apenas talvez. Confesso que quis magoá-la. E a magoei. Foi puro instinto de quem viveu esses anos todos sempre se perguntando o porquê das coisas acontecerem tão contrariamente ao que planejamos, ao que devotamos almejar.

Você, por outro lado, procurou a aproximação, pura e simplesmente. Tentou (e conseguiu) não revidar às agressões e se manteve serena em suas palavras, mas, claro, usou - aqui e acolá - da sua inconfundível ironia e de seu bom humor nas palavras escritas, para me fazer relaxar e até me fazer lembrar de quanto eu era ranzinza e grosseiro, quando queria lhe dizer alguma coisa. E, infelizmente, foi dessas ferramentas que me utilizei para lhe dizer que não precisava de sua volta, de sua companhia, depois de tantos anos.

Lembro-me, perfeitamente, daquela tarde. Ela, de todos os jeitos, foi especial. Ela simbolizou o término de um ciclo, o fim de um sonho e o começo de algo que, só em pensar, me dava calafrios, pois não me via sozinho, dali para frente, sem a presença de quem me acostumara a querer por perto. Foi dolorida, sofrida, amarga, aquela despedida. Ao pé da rampa, depois de aberta a porta do carro, apenas uma palavra foi pronunciada de minha parte: basta!

Mas não deixei de contemplá-la. Antes de engatar a marcha para sair dali, a vi subir aquele aclive e se perder por entre curvas e blocos de concreto. Acho que a decepção me fez suportar a dor, a ter coragem para regressar e poder ter forças para encarar a realidade. Só uma coisa eu não conseguia entender: por quê? Enquanto o carro trilhava os caminhos de volta, os meus pensamentos iam ordenando os acontecimentos de toda aquela trajetória vivida a dois... E chorei por todos os quilômetros percorridos até parar na porta de casa.

Uma coisa é certa: você me queria, disso eu sabia, pois já havia me dito várias vezes. Até tinha me proposto situações desfavoráveis para o seu cotidiano, submetendo-se a pequenos intervalos de ausências, mas eu não aceitei, mesmo sendo excelentes para mim. Na verdade, eu a quis, verdadeiramente, a seu tempo, com todas as benesses, sem prejuízos ou sintomas que pudessem causar sofrimento, solidão e amargura. Não a ludibriei, e nunca usei de cafajestice para conquistá-la.

O tempo passou e, hoje, você se fez presente em minha vida, de novo. Não precisava. Entretanto, posso lhe dizer que a melhor forma de a preservar, viva, em mim, durante esses anos todos, foi isolando-a do meu dia a dia, mesmo que isso tenha sido apenas no aspecto exterior, pois, por dentro, naquilo em que a alma se oferece para amortecer as dores de uma perda, você continuou a permear minhas prosas e poesias. Somente assim, através destas fugas, eu consegui dar continuidade ao “basta” dito naquela despedida.

Agora, que você resolveu me surpreender, fazendo-se viva e até querendo se justificar, inclusive convidando-me para uma conversa reveladora, a minha surpresa ficou ainda mais evidente. Como lhe disse, não será preciso; não, depois de tanto tempo. Seria somente reabrir feridas, reativar paixões, provocar desequilíbrio emocional, voltar a sentir desejos e, quem sabe - não duvido - concretizar tudo o que não concretizamos durante o tempo em que estivemos tentando ser felizes.

Contudo, gostaria de realçar a sua força de vontade, a sua capacidade de renascer das cinzas, de procurar ouvir - até mesmo de mim - os conselhos e opiniões que sempre disseram que você podia, que você era capaz. De toda nossa conversa, orgulhou-me o seguinte parágrafo dito por você: “Foram tantas mudanças em mim! Fui atrás dos meus sonhos e os realizei. Através do conhecimento, renasci; e surgi novamente, vendo-me como uma mulher que, sem dúvida nenhuma, podia ir a algum lugar, sem traumas, sem barreiras e, principalmente, com autoestima!”

Admiro-a por isso. Parabéns!
Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 26/07/2019
Código do texto: T6705356
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