O nome dele era João
Bonito igual um tiro, era o tipo de cara que fazia bagunça, que arrancava suspiros e deixava um rastro de sangue quando ia embora. Ele era o tipo de cara que realmente fazia as pessoas questionarem as decisões e motivos, os erros e consequências. Apesar da pose de bom menino e galã da novela das nove, ele estava mais para aquele moleque conversado que gosta de beber cerveja baratada na esquina. Não era nem de longe a melhor opção caso você quisesse ter algo sério, mas era o que tinha para hoje e como eu não estava interessada em mudar de mesa, deixei que ele se aprumasse para que eu pudesse entendê-lo melhor. Afinal, todo mundo é uma piscina com profundidade, não é?
Mas não João. João era um mar; revolto, escuro e perigoso. É bom que você soubesse se virar, caso contrário iria se afogar. Obrigada mãe, pelas aulas de natação desde os três anos. Graças a Deus que eu sabia nadar.
A princípio me deparei com a superficialidade incomum, um descaso irritante e aquele charme exacerbado de quem gosta e sabe que é bonito. Não que eu tivesse saco para tal roteiro. Cruzei as pernas e me virei de lado para não ter que olhar, mas ele insistiu em cruzar meu campo de visão e saber mais sobre mim. Logo, a superficialidade deu espaço a uma combinação engraçada: os mesmos gostos para músicas, opiniões políticas e gosto para filmes e documentários. Ríamos das mesmas coisas e ele gostava de dançar. Era um doce com os quatro gatos que tinha e achava interessante a filosofia vegetariana. Nos deparamos mais de uma vez com um silêncio insolente e sedutor, mas nenhum dos dois assumiria nada. Demorou quase um mês para que o braço dele tocasse o meu, no meio de uma conversa animada e depois disso foi fácil; os abraços vinham, o contato discreto e velado, até que no meio de uma madrugada enquanto voltávamos para casa, os lábios dele tocaram meu ombro nu, sob a pele tatuada.
Primeiro veio o arrepio. Depois o choque. Depois o calor. Quando me virei, ele sorriu feito um menino que faz uma besteira e acha engraçado a bagunça que causou. Contrariando tudo que eu esperava, eu senti uma vontade enorme de sorrir e avançar para ele. “Você é bonito igual um tiro, você sabia?”, eu perguntei. Ele riu, balançando a cabeça;”Você também”, foi a resposta dele. Nós nos beijamos. O texto acaba aqui, mas a noite foi pequena para nós dois e nossa história muito mais longa do que eu consigo explicar em um amontoado de frases. Logo mais ele passa aqui; domingo é dia de ficar em paz e ele sempre diz que é em meu colo que ele a encontra. João continua bonito igual um tiro, com o mesmo ar de galã de novela, só que se aprumou de ficar por aqui de vez. O mar se acalmou e a paz chegou para nós dois.