Carta a Drummond e Tancredo Neves... (postada em 19/05/17, atemporal no Brasil de 1500 a 2019))
Senhores Carlos Drummond de Andrade e Tancredo Neves, desculpem-me a formalidade, mas o respeito que meus pais me ensinaram assim o exige, espero que estejam bem desde quando nos deixaram, em agosto de 1987 e em abril de 1985 respectivamente.
Creio que os senhores, onde estiverem, vez ou outra, recebam algumas informações e atualizações da situação do nosso Brasil e da sua terrinha em particular, Tancredo de São João del-Rei e Drummond de Itabira, da nossa querida Minas Gerais.
Não só os Itabiranos e São-Joanenses não os esquecem, na verdade, nós, os brasileiros de todos os cantos, sentimos muito suas ausências, embora nos tenham deixado vasto material sobre valores, costumes e boas práticas de civismo, estamos cá com graves problemas nessas áreas.
Senhor Drummond, ainda estudamos seus escritos para deles extrairmos suas ideias e ensinamentos sobre o amor, a tolerância, paciência, angústia e arrependimentos depreendidos de seus versos de toda uma vida.
Ah! Senhor Drummond, sua habilidade com as palavras nos coloca diante de caminhos e obstáculos de difícil ou fácil transposição, depende do leitor, do dia da leitura ou das tantas releituras, as pedras da vida lá estão e nunca no mesmo lugar, permitindo belas equações de amor e superação.
Já o Senhor, Seo Tancredo, em um de seus discursos, propondo mais conciliação, nos ensinou que, “A Pátria é escolha, feita na razão e na liberdade. Não basta a circunstância do nascimento para criar esta profunda ligação entre o indivíduo e sua comunidade”.
Senhores Drummond e Tancredo, nosso Brasil anda estranho demais, continuamos sendo um país do futuro em vários aspectos, especialmente na saúde e educação, pilares de uma nação que almeja desenvolvimento e dignidade para todos.
O gigante continental da América do Sul está carente de líderes políticos com visões de estadistas e empresários que visem mais que apenas o lucro do capital e assumam sua responsabilidade social.
Vivemos um período de grande insatisfação com divisões no seio do povo que extrapolam o bom senso e não residem apenas na divergência de opiniões, muitos, sem rumo e com pouca massa crítica, se deixam levar por meios de comunicação que manipulam a informação dependendo dos interesses próprios e das ocasiões.
Necessitamos de líderes que nos mostrem caminhos em meio às pedras e que persistam na boa trilha da valorização da Pátria enquanto espaço para a dignidade humana que está além e muito além das letras mortas dos estatutos dos partidos políticos.
Drummond e Tancredo, permitam-me agora como irmãos que sempre fomos e seremos, estamos a precisar de paz e serenidade para desanuviar o ambiente pesado que paira sobre nós.
As energias densas estão a ofuscar a razão que nos jogam na sanha das paixões sem freio, claro, temos sim nossa parcela de responsabilidade pelo que nos ocorre, mas pedimos, de onde estiverem, juntem forças com outros brasileiros, renomados ou não, mas de grande valor moral, ético e cristão, e nos cubram de amor e pacificação.
É em nosso Brasil, vocacionado para a espiritualidade e humanidade, onde convivem credos diversos, trazidos pelos escravos africanos, católicos, evangélicos, espíritas, budistas, muçulmanos, islamitas, xintoístas, cristãos e ateus, que todos se juntam em oração.
Mãos dadas, como uma família que somos, clamamos ao Deus de todos, bençãos para que os homens sejam fraternos e acordem da indiferença, do orgulho, da vaidade e da soberba que lhes cega ante todas as misérias.
Estamos de passagem neste plano onde a ilusão do ter e do poder estão mascarando um triste despertar.
Luz, paz, amor, ternura e serenidade.
Fraterno abraço.
Paulo Afonso Barros
Maio de 2017
No Meio do Caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
Carlos Drummond de Andrade
In Alguma Poesia
Ed. Pindorama, 1930
© Graña Drummond.
In: http://www.algumapoesia.com.br/drummond/drummond04.htm
Trecho do discurso de Tancredo Neves preparado para a posse na Presidência da República, em março de 1985.
“Senhores Membros do Congresso Nacional, recebo da soberania do povo, de que sois portadores, a chefia do Estado e o governo do País. Esta solenidade encerra singular mistério de liturgia cívica. A Nação inteira se reúne, pelo instituto da representação, em sua vontade e em sua esperança, para investir um homem da responsabilidade de a conduzir, na lei e na dignidade.
De cada um dos homens que constituem a comunidade nacional transfere-se, ao coração e ao espírito do escolhido, um homem como os outros, parcela essencial de ser, na devoção aos valores comuns e na inquebrantável decisão de os preservar para sempre.
Ao assumir esta enorme responsabilidade, o homem público se entrega a destino maior do que todas as suas aspirações, e que ele não poderá cumprir senão como permanente submissão ao povo.
Quando falamos em povo não pensamos em uma entidade abstrata, que possa ser eventualmente conduzida em trilhas de equívoco, pelo fanatismo ou pela demagogia. Pensamos no povo como soma de razões e virtudes, que sempre prevalecem, para impor lucidez à história, restaurando o que se deve restaurar, abandonando o que se deve abandonar e construindo o que se deve construir (...).
In: https://oglobo.globo.com/politica/discurso-de-tancredo-neves-preparado-para-posse-na-presidencia-da-republica-3021920#ixzz4hVRdpHYM
Paulo Afonso de Barros