De volta pra casa

BsB, 17 de setembro de 2007

E aí meu nobre e querido amigo? Como vai essa sua força? Eu vou bem, muito bem por sinal. Tudo que tenho feito tem dado bons resultados. Tenho colhido ótimos frutos. Tenho semeado excelentes sementes.

Não sei se você ficou sabendo que fui pescar na ilha de Marajó, um paraíso a céu aberto, uma exuberância por excelência. Por lá, a natureza parece ter sido favorecida pelos deuses mais poderosos: as flores são mais viçosas, as águas são mais tranqüilas, os búfalos mais fortes do que os que eu conhecia até então. A noite tem mais estrelas que em os outros cantos do mundo por onde fui andarilho. A lua bebe o néctar que restou nos poços onde os primeiros habitantes se fartavam de água fresca e doce. O sol brinca fazendo sombra na grossa areia da praia, como se fosse um menino apaixonado que gosta do escurinho do cinema.

Os moradores da cidade de Salvaterra, parecem ter esquecido as desavenças que rondam outras regiões: não fazem perguntas complicadas, não maltratam os visitantes, não escondem os seus sorrisos, não fazem mistério com as coisas simples. Levam a vida como se ela fosse uma grande festa. Dançam o irreverente carimbó, um folguedo divertido, com muitas palmas, muitos gritos e músicas eletrizantes. Uma diversidade enorme de cores e roupas é apresentada a cada alegoria. A alegria dos dançarinos é um convite insistente aos que assistem extasiados ao belo espetáculo.

Mas como nem tudo é festa, chegou o momento de voltar para casa. Minhas férias estavam por um triz. Já sorvendo as derradeiras delícias do paradisíaco recanto e, deslizando os olhos sobre as águas revoltas da Baía de Guajará, deixando para trás todas aquelas riquezas que me foram apresentadas pelo atencioso guia da Pousada dos Guarás, o jovem Sidney Penante, não imaginava que ainda pudesse encontrar algo mais excitante e encantador do que tudo aquilo que havia visto naqueles últimos dias. Nas proximidades do continente, à frente da proa, como se boiasse depois de um brutal esforço, oferecendo a mim, este simples mortal, o mais belo sorriso que uma deusa pode ostentar. A imagem de minha amada, ainda que distorcida e quase apagada devido à força que a maré exercia contra a praia provocando fortes e constantes marolas, deixava claro que eu era o mais feliz dos viajantes. Eu sentia que ela estava ali, eu sabia que ela estava lá. Era como se uma flor nascesse naquele exato momento e viesse até a mim. Era como se o sim e o não, fossem a mesma planta. Era como se a água e o fogo se misturassem na mata densa. Era como se os meus pensamentos houvessem me levado de corpo e alma ao seu encontro. Era como se eu me tornasse o vassalo mais servil do reino de Iemanjá.

É meu caro amigo, a ilha de Marajó jamais será a mesma, nem eu serei o mesmo, nem o guia será o mesmo, nem os búfalos serão os mesmos, nem as borboletas silvestres serão as mesmas depois daquele encontro sub_liminar que você pode chamar de neurose ou esquizofrenia. De psicologia não entendo nada, mas de saudade conheço quase tudo e, como disse ainda há pouco: eu vou bem, muito bem por sinal. A vida tem me presenteado como nunca havia feito. Por isto, o ontem, não poderia ter sido diferente.

Um grande abraço,

Pedro Cardoso DF
Enviado por Pedro Cardoso DF em 17/09/2007
Reeditado em 05/12/2022
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