Amor em Mississippi
Escutando “You made me love you” by Patsy Cline
Greenville, Mississippi – 03 de setembro de 1985.
Oi querida.
O calor ainda está de matar aqui em Greenville. Está até mais quente comparado aquela vez que esteve aqui.
Ainda estou usando aquele vestido de flores azuis que você me deu e o ícone chapelão cor de vinho tinto. Acabei de chegar da feira de automóveis antigos. Estão fazendo um leilão para arrecadarem dinheiro para reforma daquela velha capela no final da Fillmore St. A parte boa é o envolvimento da comunidade. Uma graça!
Estou com saudades de você.
Acabei de criar um novo drink. Aquele “Bloody mary” perdeu a graça depois que você se foi.
Peguei 3 limões sicilianos, essência de menta, um pouco de açúcar, vodka e muito gelo. Bati tudo junto e confesso que ficou gostoso. Um doce amargo, mas ficou bom.
Brindei sozinha a solidão, a falta de ver seu sorriso tímido, as suas unhas descascadas, a sua frieza intocável.
“Saúde!”
Não é todo dia que a gente recebe companhias, não é mesmo?
Estar sozinha hoje é o que me resta de você.
Meu piano encostado naquela parede onde você borrou com marcas de beijos com seu batom marron está cheio de poeiras. Nem ousei em tocá-lo mais. Perdeu a graça.
Sei lá... Às coisas andam monótonas, e como não tem ninguém aqui para me tirar do sério, minha rotina anda muito chata.
Fico aqui recordando nossas fugidas àquela torre de vigia do casarão antigo perto da Prefeitura velha, e a correria que era quando os guardinhas notavam que a gente estava lá em cima. Aquela sensação de ser pega era uma adrenalina incrível. E depois poder olhar para suas bochechas rosadas, saudáveis, só pelo fato de se exercitar, não tinha preço!
Oh, como sinto sua falta!
Sinto muito por tudo.
Sinto muito por nada também.
Os anos se passaram, envelheci, aprendi com meus erros, deixei para trás algumas coisas que não valeram a pena... Arrependi-me.
Aquela nossa foto tirada debaixo da árvore com cipó e o balanço estão ainda naquele porta retrato que você também me deu. É a visão mais clara que tenho de nós.
Despeço-me mais uma vez sabendo que nunca lerá essas palavras.
Abraços, beijos, cheiros...
Eterna K.