L-I-B

Eu não sabia ao certo o motivo de ter aceitado o convite para aquela viagem de 3 dias. Mesmo que não fizesse sentido era tarde para recuar. Estavam postas as malas no carro. Bastaram alguns minutos para chegar ao ponto de partida. O começo da minha realidade inventada.

E lá estava você. De pé. Seus olhos vagavam distantes enquanto carregava consigo um livro do Harry Potter e um bicho de pelúcia que eu nunca soube distinguir se era um urso ou um cachorro que mais tarde eu viria a conhecer como o famoso “Roney”.

Eu não te conhecia. E naquele momento tudo que o tempo me cedeu não ultrapassava uma observação superficial e sem sentido aparente. Eu estava longe de saber que a ficção dos livros e a companhia do pequeno amigo eram a sua proteção. E foi assim, observando-a agarrada á esses fiéis aliados que percebi o quanto era grande a sua solidão.

Eu cheguei depois de você e lhe encontrei ali. Somente depois pude perceber que quem tinha me encontrado foi você. Justamente quando eu não queria que alguém encontrasse. Instantaneamente impôs sua presença e com um sorriso arreganhado me convidou a conhecer o prazer dos instantes. A sua efusão não me incomodava. Pelo contrário, eu adorava a sua vontade de viver e o exagero em contemplar as mínimas coisas que para nós eram tudo. Aquela menina solitária do começo da viagem havia se dissipado e dado espaço para preencher de descobertas e surpresas. Surpresas. Sempre me senti desconfortável com elas e não foi diferente assim que ouvi o primeiro “Eu te amo” sussurrado no ouvido. Assim, rápido e cortante. Arrepiou-me os pelos e o estômago pesou. Era a primeira vez que ouvia nítida essa frase de alguém. Eu e você sabíamos que não se tratava de romance e a vergonha de demonstrar carinho não existia na nossa relação. Tudo parecia tão real e especial mesmo era o nosso desejo de que realmente fosse.

Estávamos de férias! Tudo para você tinha valor e nenhum minuto era digno de ser perdido. De férias ou não. 3 dias me passaram como 3 eternidades de felicidade ao redor da fogueira e angústia concentrada nas cadeiras vazias do auditório. Como isso foi possível? Todos os momentos se fizeram intensos por si só sem precisar de esforço. Aprendi então que amizade não dá trégua. Agora aguenta.

E aguentei ver você partir rapidamente, exatamente como chegou. Ainda guardo as fotos, a sua carta, e no punho, as cicratrizes do nosso pacto de amizade eterna. Ah! As cicatrizes. Cortes feitos com lâmina de apontador. Realmente interessa se infeccionará? O importante é ver sangrar e acreditar. Eu acreditei.

Num período de alguns anos tudo vira pó. Sei que sempre lembrarei de como me senti e de tudo que vivemos, porém, não consigo me lembrar de você, não é irônico? Na verdade, é uma decepção. Triste lamento enquanto assisto toda nossa riqueza perder a cor, o encanto e o sentido.

Não perdi, entretanto, o seu telefone. Você está sempre online e acredito que ainda more por perto. Seria fácil lhe reencontrar. O problema é que você se perdeu em algum lugar do meu coração e como pôde? Um espaço tão pequeno como o meu peito não lhe dá esse direito!

Você sumiu e levou consigo o “L” e muitas vitórias. O “I” parou no tempo. E o “B” voltou para a estante.

Bárbara_Marques
Enviado por Bárbara_Marques em 21/08/2018
Código do texto: T6425374
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