nada me pertence

tudo se dissipa.

Vaza pelos dedos das minhas mãos

Me torno expansão. Sou tudo. Mas nada me pertence.

Tudo vira pó, sujando minhas ventanas

cobre-me de poeira, sou areia, do mar que virou sertão

Tenho sede de mim,

me desejo me quero me anseio, mas não me pertenço, pois nada me pertence

Já eu, eu pertenço ao mundo, seus jogos planos e estratégias

pertenço ao verso que me traduz

pertenço a terra que me come, a agua que me sacia a sede

pertenço ao fogo ébrio das paixões, ao vento que me golpeia a pele

pertenço aos olhos úmidos, a lua que se despede, ao caos urbano

pertenço as lembranças intrépidas e vulgares

pertenço a toda folha, que de tão seca, é levada pelo vento

pertenço ao tempo, ao eterno movimento

pertenço ao meu espírito vagabundo, que vagueia pelo mundo

Penso, permaneço, despermaneço, mas não me pertenço, pois nada me pertence

Já eu, eu pertenço a todo azul, que de tão vasto, faz cobrir o céu inteiro

pertenço a todo drama exagerado e loucura absurda

pertenço a todo pássaro, que de tão livre, voa ao rumo do vento

pertenço a tudo que há de mais visceral, de mais animal, de mais radical, ancestral

pertenço ao meu corpo casa casulo casca, que de tão organico, alimenta a terra

pertenço a toda dor da espada que crava meu peito

e pertenço a toda coragem de seguir minha verdadeira Vontade

pertenço aos meus passos, que de tão largos, me levam ao Sol

pertenço aos meus gritos infimos e abafados

pertenço ao silencio calado e vazio, porém cheio de si, de mim

pertenço ao riso ao verso ao vício

as lagrimas, que de tão mornas, fazem chover o céu inteiro

Eu pertenço as memórias que não são minhas, aos sussuros incessantes

pertenço aos medos taciturnos e desejos guardados

pertenço a melodia da menina que me canta, me faz morar em seus lábios

pertenço ao destino traçado em minhas mãos, que de tão ciganas

percorrem meu rio inteiro

pertenço aos sonhos líricos e ousados, aos mistérios, aos erros ermos

pertenço ao Deus que eu invento e aos demonios que eu crio

pertenço a poesia barata, ao coração aberto

pertenço as galaxias que me cercam, as estrelas que me observam

pertenço as bocas que me beijam, me chamam

aos ouvidos que me ouvem, aos olhos que me vëem

pertenço a todo canto, toda canção

pertenço a todo santo, a toda morte bonita e inevitável

pertenço a saudade constante e inconstancia cotidiana

pertenço ao Amor, indefinivel e infindavel

pertenço a quem me cria. Sou todo dia

corpo canção

lábio memória

poesia

Pois nada se pertence.

Lírio Gita
Enviado por Lírio Gita em 03/08/2018
Reeditado em 08/08/2018
Código do texto: T6407985
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