“Quem bate, esquece. Quem apanha, jamais”: o bullying de um qualirinha
Aqui, pensando um pouco, exclamo-me: caracas, como eu ascendi! Destaco. A intenção não é me afogar na praia. Galguei apenas um pedacinho daquilo que o mundo ainda tem a me oferecer. Queria voltar aonde tudo começou, naquela escola de ensino fundamental da zona Rural de São Luís, onde pessoas como eu matavam vários demônios por dia para tentar sobreviver.
Sempre fui um menino aquém dos vis padrões sociais. Não tinha corpo atlético, jeito másculo de um aprendiz de machista, recursos financeiros para ter um estilo da moda (lembro-me até que, quando fazia o jardim de infância, eu só tinha duas camisas amarelas, idênticas por sinal, estampadas por um anjinho) e, principalmente, a ignorância, para não dizer burrice, daqueles que sempre queriam levar vantagem sobre os outros.
Agressões físicas e psicológicas marcaram a infância de alguém que só queria ser como qualquer outra criança. Exclusões das brincadeiras, porque o “viadinho”, “cotchó”, “tchola”, “qualira”, “bambes”, “Abelardo” não sabia chutar uma bola (de fato, eu poderia nem saber mesmo), eram rotineiras àquele menino.
Aaaaah! A solução seria ir pular elástico, brincar de cancão (amarelinha), jogar queimado com as meninas. Mas aí a pressão social era maior e o tormento voltado àquela criança piorava ainda mais. Vizinhos apontavam, família questionava e “amigos” riam. Riam de um perfil indefeso que achava que ele era o erro. E uma cruz abstrata era carregada cotidianamente em suas costas.
“Quem bate, esquece. Quem apanha, jamais”, dizem. Talvez esta seja a máxima que resume parte da minha vida. Mas calma, gente! Eu tinha meu valor. Ou como que a maior parte das turmas em que estudei passaria de ano sem que fizesse grupo comigo nos trabalhos de classe? Os meus "colegas" absorveriam o conteúdo por osmose? Pena que aquele momento de paz seria passageiro e as ofensas continuariam até o próximo bimestre.
Lembro-me de uma vez em que um grupo de meninos e meninas me pegou após o lanche da escola e me forçou a comer uma salsicha velha que estava no chão. Traumático, não? Aquela situação foi tão vergonhosa, que derramei em lágrimas toda a coragem de denunciá-los à administração do colégio. Fiquei ali, no meu mundo, sozinho, esperando o próximo ataque, sendo psicológico, na maioria das vezes.
Parece até história de filme hollywoodiano, mas quando vejo publicações deles de uma vida medíocre nas redes sociais, atualmente, relato: “Ei, ex-colega de classe e ex-vizinha, eu sempre fui mais valioso que o teu cachorro. Só não tinha essa consciência”. O Abelardo aqui cresceu e vai voltar ao início do fim. Não com a intenção de se superiorizar, mas para escrachar o quanto fizeram parte de pesadelos da vida dele, que felizmente, hoje, foram suprimidos por sonhos de um futuro brilhante.
O motivo deste desabafo? Bullying é a forma mais cruel de se aprender. Machuca mais do que você imagina. É muito menos engraçado do que você supõe.