Última lembrança
Teve uma manhã do mês de fevereiro que os pássaros não cantaram, que os carros não passaram pela nossa rua e que o sol não apareceu. Neste dia eu pensei em comprar o teu presente de aniversário, um kit de linhas para crochê ou quem sabe mais uma camisa minha que ficaria enorme em ti. Não comprei nada, naquela manhã eu não saí de casa, não quis, nem sair e nem comprar. O orgulho, dizem ou melhor você me dizia que é o pior amigo que podemos ter. E tornou-se, então, o meu melhor amigo, já que tu largou o cargo dias antes. Ainda naquela manhã eu rasguei o papel em que estava nossa caricatura feita numa cidade e assinada com o nome de outra. O que não fez diferença, porque eu o sei de cor cada detalhe de como e quando ela foi feita. Mas, se por acaso em outra manhã eu esquecer, não vou ter como lembrar, E já não há razão para isso. Naquela manhã que os pássaros não cantaram e os carros não passaram e o sol não apareceu e eu pensei em comprar o teu presente e eu não comprei e eu não sai de casa e eu rasguei nossa última lembrança juntos. Eu soube que seria o fim, era e foi.