Berlim
 
 
Querida Desconhecida,

   Caminhava pelas calçadas de Berlim, observando atentamente tudo ao meu redor, desde o som do sino da igreja a barraquinha de cachorro-quente na esquina do hotel. Aquele clima pacífico apaziguava meus pensamentos, como se o exterior pouco importasse.

   Infelizmente, em um momento de desatenção, atravessei a rua sem qualquer cuidado. Os freios daquele taxi não puderem lhe conter a tempo, o motorista, fez o que pode e desviou seu trajeto, levando consigo a caixinha de correspondência, um poste e se chocando contra o muro da igreja.
   Ainda podia ouvir o partir dos vidros, enquanto andava devagar até o carro, entre os destroços deixados. O medo alastrou-se pelo meu corpo e aquela sensação de culpa consumia minha alma.
   Pedi socorro para dois homens que apareceram ali, tiramos o motorista com cuidado, seus braços estavam cobertos de sangue, muito provavelmente cortados pelos pedaços do para-brisa. Por um segundo, minha respiração travou, olhara para o banco de trás e apenas encontrava uma pequena bolsa roxa, do outro lado, porém, uma mulher se arrastava como podia, para longe dali.
   Parei ao lado dela e pedi desculpas sem fôlego, tropeçando em cada sílaba. A ambulância chegou e levou os dois para o hospital mais próximo. Permaneci, encostado no que sobrara daquele velho taxi amarelado, a polícia levou-me para a delegacia, respondi todas as perguntas e acabei liberado. Passei pelo taxi antes de voltar ao hotel, furtando a bela bolsa roxa.
   O hospital era um local muito bonito, tinha um jardim de dar inveja a qualquer apaixonado por flores. O filho mais velho do taxista, estava ali, no corredor, a alguns passos de mim. Havia deixado claro, minha total preocupação com a saúde de seu pai, mas, no fundo, não escondia, que o grande motivo de estar ali, era pela mulher daquele banco.
   Sobre a cama no quarto do hotel, a bolsa repousava, meus pensamentos se enrolavam a cada possibilidade, não podia mais conter aquela curiosa vontade de abri-la. Duas semanas se passaram, gastei os euros que tinha e alguns que precisei arranjar para quitar as despesas com o carro do taxista.
   Encontrei o endereço de Eleonor, a dona da bolsa, e deixei esta carta como uma breve tentativa de me desculpar. Agora, que finalmente expliquei tudo o que aconteceu, espero que não guarde rancor deste ato inapropriado, jamais pensei que algum descuido pudesse causar tanta angústia a mim mesmo.
   Quanto a sua bolsa, não retirei nada que lhe pertença, apenas não me contive ao ler seu diário, ao poder conhecer um pouco mais desta a quem escrevo. Fico encantando em encontrar tantos sentimentos em pequenos pedaços de papel, isso prova, com toda certeza, como a vida é marcada por momentos, e a capacidade de cada um guardar-se dentro de nossos corações.

 
Com carinho, Benjamin.
 





 
 
 
Carta realizada nos parâmetros do Clube do Escritor – COC – Rio do Sul
 
Foram escolhidos pelos participantes do clube:

Lugar: Berlim
Objeto: Cachorro-Quente
Som: Vidro Quebrando
Cor: Roxo
Ambiente: Igreja
Sentimento: Medo.
 
 
 
 
Johan Henryque
Enviado por Johan Henryque em 05/11/2017
Reeditado em 05/11/2017
Código do texto: T6163500
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