A vez que respondi a mim mesmo
“Não compartilho da crença num progresso infinito quanto às sociedades; acredito nos progressos do homem em relação a si mesmo."– Honoré de Balzac
A prisão é psicológica. Não há método melhor de dominação do que a autodisciplina,fundamentada por uma beligerante e sofisticada retórica de controle. Nossa matéria é usada diariamente e moldada ao bel-prazer dos líderes desse grande clã social. Nossos debates,caro companheiro,podem transcender a materialidade corpórea,mas acredito que sempre estaremos expostos às forças mundanas. E para suportá-las,temos o vinho. Fico muito feliz em receber seu pequeno laurel,depoimento que me embriagou como vinho e me deixou feliz como amor. Lembro das vezes que viramos madrugadas balbuciando diálogos frívolos,entre nós mesmos,sonhando em estar em qualquer lugar,menos ali. E nós saíamos de lá,pelos métodos convencionais e outros mais exóticos. É impressionante como você me faz falta nos dias de ilusões,nos dias de indecisão permanente e nos dias de puro delírio. Você tem o sacro. Não se esqueça. Eu sou apenas mais uma alma inconsequente. E feliz,ao mesmo tempo. Preciso dizer que eu também estava lá quando sonhávamos em transformar o mundo da noite para o dia. Você,apesar de todo laconismo,foi o responsável por me lembrar de que o sonho,por mais alto que seja,está ali,virando a esquina da vida. Eu queria poder contagiar essa alegria com o mundo. Dionisio,filho de Tebas e pai do vinho,o fez com exímio e maestria. Lembra-se de quando descobrimos em Hegel que nós damos direção às nossas próprias contradições? Pois é. Acho que não aprendemos direito. Lembra quando lemos o Alcorão e memorizamos,em um estado de mais pura e humilde fé,algumas suras? Lembra-se dos jejuns do Ramadan? Que saudades. E aquela vez que comemos coxinha ao som de Filipe Ret? Eu sei,velho amigo,de impoluto caráter,que eu sempre prejudiquei sua vida. Você estava lá,pensando em transformar e eu sempre o levei para a fuga,ao esvazionismo. Agora,estamos distantes. Eu e você já não somos mais a mesma pessoa. Repouso são e consciente no fundo do seu coração taciturno e tolhido. E digo que sua escrita fez renascer,nas profundezas mais recônditas da minha alma,a chama da esperança.
OBS: entendo sua necessidade de irradiar todo seu fausto e pompa com essa prepotência. Mas não se pode parecer arrogante,não é mesmo?
Sim,eu sou hipócrita. Mas quem não é?
Por isso,a frase como de Balzac de introito. Talvez nunca conseguiremos alçar voo rumo ao nosso sonho social...mas nosso sonho pessoal está próximo. Agradeço pelo desabafo. Sei que,para você,exteriorizar um sentimento é assaz perturbador.
Você tem as minhas qualidades. E eu o amo por isso.
À minha face espartana,do seu irmão perturbado e nímio,
Com eterno saudosismo,
A alma tragicômica inebriada.