Tempo Perdido

Hoje foi um daqueles típicos dias que fiquei extremamente agoniada, esperando uma mensagem ou qualquer sinal de sua parte. Ontem, sai e no bar o assunto do momento foi você, troquei número com algumas pessoas, mas até agora busco a coragem para falar, por que no fim todos são apenas interesses momentâneos.

Sorrisos, troca de olhares e uma leve atualização no celular esperando por uma mensagem sua. Nada, simplesmente nada. Pela madrugada, procuro meu telefone, quero te ligar, dizer que te amo e que estou sentindo sua falta. Grito o quanto sou imatura. Disco seu número, não chama. Não insisto. Vai ver é o destino me poupando de um sofrimento maior. Meus amigos riem, eles não conhecem a cidade a noite, e a cada passo apresento uma história, seja ela triste ou engraçada, por alguns minutos esqueço de você.

Me sinto a cidade, cada parte dela faz parte do que sou e cada parte da minha história ocorreu em algum lugar dessa cidade. O vento bate no meu rosto, tão suave, fecho os olhos e ergo os braços, por alguns segundos me sinto livre, viva e leve. Meus olhos marejam por alguns segundos, repito comigo em alto e bom som: “Vento! Carregue tudo aquilo que me aflige, que me prende, leve contigo todas as energias negativas, se possível vento, te peço leve esse amor”.

O vento passa mais forte, quase que obedecendo ao meu pedido. Os carros passam, cada vez mais carros, pessoas indo e voltando, sozinhas, casais, famílias, amigos e motoristas com seus ônibus cheios de rostos, alguns cansados, outros entusiasmados com as luzes da cidade, alguns perdidos em suas músicas que tocam nos fones de ouvido. Enquanto, isso estou perdida em meus pensamentos que vagueiam em meio a imagens, sons e cheiros que me rementem a você.

Retorno a realidade, meus amigos riem de algo. Eles estão realmente felizes e chapados. Grito o mais alto que posso que preciso beijar alguém, queria me sentir amada, mesmo sabendo que seria só aquela madrugada. Decido rapidamente que iremos passar pelo Conic, um dos meus lugares preferidos da cidade. Sabe o que é ter uma igreja Universal e um puteiro dividindo parede? Você encontrar diversas tribos em um só local? E ainda poder escutar um velho e bom rock nacional ao vivo, cantando por aqueles que viveram Legião, Capital e Raimundos na sua formação, que defenderam a nossa democracia. Em um local com ar de caótico cheio de intervenção artística, cultural, lojas exóticas e de gente esquisita, que simplesmente te abraça.

Meu semblante carregava um sorriso bobo, um olhar distante, mas eu reparava tudo a minha volta, aquele lugar carregava tanta história e a minha vontade era de saber todas. Confesso a madrugada pelo Conic tinha um ar de melancólica, acredito que mais do que isso. Muita gente chapada, embriagada caindo, moradores de ruas que eram comuns já durante o dia, mais durante a noite duplicavam.

Sentamos e eu fiquei a observar o céu, mesmo não havendo nenhuma estrela para apreciar, isso me dava a noção de o quanto eu era egoísta acreditando que o mundo girava ao meu redor. Ao fundo meus amigos conversavam e a banda que ensaiava tocava “Tempo Perdido, do velho Legião”. Aquilo me preenchia. Me senti por algum tempo infinita.

Naquele momento nada pareceu fazer sentido. Agora, com todo essa angustia, consigo perceber que tudo aquilo pareceu – me algo orquestrado, precisava viver, preciso viver tudo isso, no fim é mais uma história em algum canto dessa cidade, mas é a minha história quem eu sou. Não posso colocar ponto final, não agora, quem sabe o que venha por esse instante é uma vírgula, ou a conclusão de um capítulo. Mas não é hora ainda do ponto final, nos dois sabemos disso, por que naquele dia me senti amada.

No ônibus, voltando para casa, meu celular toca, me liberto da paralisia de olhar pela janela. Do outro lado da linha, meio distante, como se ainda estivesse dormindo, uma voz rouca e grave. Você me perguntando onde estou, dizendo que acabara de sair da minha casa. A voz carregava um certo tom de ansiedade e preocupação. As palavras saiam da minha boca com uma certa dificuldade.

No fim daquela madrugada, mudei de rota. Nesse caminho já muito frequentado, encontrei um dos melhores abraços e sorrisos. Ali me senti amada, por você e pelo sol que nascia, abençoando o nosso amor.