Sem Destino

Não colocarei destinatário nesta carta, caso consiga escrevê-la será lançada ao vento, o vento que destine seu caminho, dissolva-a na sarjeta, embriague-a nalguma taça de vinho. Faz frio, é madrugada, talvez repouse imaculada em copo de cachaça. Tentei lapidar o meu caminho e errei em quase todos os sentidos. Na forma, nos ângulos, nas arestas, no brilho. Caminho torto, cortante, opaco. E minto ao dizer "errei em quase", errei em todos os sentidos.

Nada de água vinho ou cachaça, que caia no fogo e finde queimada. Assim como queimei minhas oportunidades de felicidade.

Aqui ao alcance das minhas mãos o botão sobre a mesa. Botão grande feito de osso. Abotoava o agasalho que ela usava quando me disse Adeus. O botão não desprendeu-se e foi ao chão, ela o arrancou e colocou na palma da minha mão. Olhou nas profundezas dos meus olhos deu-me as costas e partiu. Um botão de osso que ela arrancou do seu agasalho foi tudo que ficou. Os quatro olhos desse botão me assombram desde então. Me fazem perguntas que não quero ouvir, mas ouço. Finjo que não ouço para não responder.

Perdi a noção do tempo, perdi a noção de tudo. Eu minto, nunca tive noção. A carta será atirada ao vento pela janela do quarto que foi dela.
Não resolvi ainda o que vai com ela. Talvez o botão, talvez ele não, talvez na palma da minha mão.








 
Yamãnu_1
Enviado por Yamãnu_1 em 10/06/2016
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