SEM AÇÚCAR, COM AFETO
Quando fico sozinho e a visita se foi, penso no que foi dito.
No silêncio oco da cabeça, as últimas palavras da conversa que já embalavam o entorpecente e leve sono ecoam...
Então, no pensamento, resolvo isso indo até ao portão, ao carro. Ali detenho o tempo e no bojo dessa eternidade eu delongo, me diluo e extraio do efêmero o que não me desfaço.
Como cãozinho que se despede, abano a mão, aceno e faço rasgar numa última despedida o riso na sua boca esgarçada.
Aprendi o que antes me parecia mal educado: impedir que a visita tomasse seu rumo e fosse embora, que durasse mais estar perto.
Por isso seguro com as minhas palavras o seu tempo e exploro sua permanência com terceiras intenções.
É que pretendo cumular valores, uma mais valia genuína e guardar para sempre o sabor da sua figura.
E assim, quando no oco escuro da boca fechada eu estiver sozinho,
ainda possa sentir o hálito fresco da sua presença.
Ainda estamos,
leia em voz alta uns versos de Caeiro
enquanto preparo o hibisco
sem açúcar, com afeto.
Antônio B.