ESPELHO RETROVISOR
O tempo agora me aprisiona
Por vezes me molesta, por hora me esnoba
Não permite que apenas me olhe no espelho
Mas me obriga a encarar meus contornos
Segura meu queixo e comprime meus lábios
Cada traço já não é mais o mesmo
Fecho os olhos e apenas me relembro
Agora sem a certeza das marcas do tempo
Aos poucos meus dedos percorrem minha face
Meus olhos entreabertos percebem as cicatrizes
Um breve lampejo deste cárcere sem freios
Não existe retorno ou contorno a esquerda
A estrada desta viagem apenas segue seu curso
E a cada piscar de olhos os quilômetros nos traem
Muitas risadas são ouvidas, conversas, amores e enganos
E pelo retrovisor é possível ver também as lágrimas
Daqueles que também estavam nessa mesma viagem
Lágrimas de paisagens em constante movimento
Mas elas não me pertencem, são do tempo
No espelho deste minuto em que silencio em meu peito
Eu sinto saudades de outrora, de cada quilômetro rodado
Ao lembrar do seu cabelo macio cor de prata...
Da sua linda barba farta, Do seu ar imponente!
Da sua voz alta e a Da sua risada chorosa.
Cada um deles viajou ao meu lado e ao seu tempo
Viajantes que deixaram sua imagem em minha mente
Por vezes minha memória embaça o retrovisor e então cada vez mais preciso forçar meus olhos para tentar vê-los mais uma vez
Eu sei que sequer o meu reflexo já não é mais o mesmo
E eu ainda em curso tento me lembrar de quem eu era a poucos quilômetros atrás
Apenas sigo as placas, guiada pelo amor e pelas minhas intuições
E quando a noite chega... o escuro, a lua, as estrelas e o vento me embriagam, então deixo que me guiem
Eu não sei em que momento serei eu no retrovisor
Mas sei que hoje me olho no espelho e apenas sinto a velocidade, e o quanto algumas paisagens sequer posso mais contemplar
Não temo o fim da estrada, mas se alguém irá me procurar no retrovisor do tempo...
Drica Barreto