Eu não estou nem um pouco a fim de você

Não, eu não estou te "dando mole". Nossos olhares se cruzaram numa fração de, sei lá, dois segundos ou menos e foi por acaso. Estava na verdade chamando o garçom, atrás de você. Meu riso não é alto pra chamar sua atenção, é que não consigo ser feliz de maneira contida, sem que percebam. Passo a mão direita no cabelo a cada cinco minutos, mas não estou fazendo charme, é mania que tenho desde criança. Não me produzi pra te impressionar essa noite, aliás, o comprimento do meu vestido reflete apenas o meu estado de espírito, mas confesso, é também pra justificar as duas horas que passo na academia cinco vezes por semana. Não teria sentido tornear as pernas para escondê-las em burcas que me impossibilitariam de exibi-las, - exibi-las sim, porque tenho esse direito - o que não me transforma num pedaço de carne ambulante oferecendo-se indiretamente. Tive vontade de sair com as minhas amigas, é sexta-feira, trabalhamos durante toda a semana e decidimos jantar, beber um vinho e depois dançar, temos 27, 29 e 30, - a de 27 sou eu, só pra constar - não estamos desesperadas por um marido, o relógio biológico ainda não bateu, não somos amargas e nem estamos infelizes. Somos três mulheres solteiras, lindas, independentes - e nada modestas - sentadas à mesa e fazendo um brinde à amizade e à vida. Pensei em escrever tudo isso atrás do guardanapo que me foi enviado com o seu número escrito e dizia: "... Me liga, delícia...", mas perderia meu tempo explicando algo que irá entender assim que recebê-lo de volta. Até porque, a única coisa da qual irá comprovar o sabor é a comida desse restaurante, que por sinal, é mesmo uma delícia.