Carta de Aposentadoria
Aos cinquenta e dois anos de vida recebi oficialmente a minha carta de aposentadoria por tempo de serviço pelo INSS. Trinta e cinco anos comprovados, mais sete não contabilizados. Missão cumprida! Tiro um peso das costas, ao mesmo tempo me sinto realizado pelo dever cumprido, dos filhos criados, das conquistas materiais, tudo fruto desse trabalho.
O que farei daqui para frente? Deixarei a barba crescer? Que tal um cavanhaque? Fumarei um cachimbo, ou aprenderei a tocar violão? Quem sabe leia aqueles livros guardados e liberte os personagens deitado numa rede, poderei ler os Pré-Socráticos na fonte sentado na poltrona reciclável ao som de Bach. Quem sabe entre numa academia, ou funde um ONG. Quem sabe?
Mas, para que a pressa? Se ainda me encontro na plenitude da razão, com o esplendor da saúde. Sim, existem algumas dores pelo corpo, mas o que mais me dói foram as lições amargas, os fracassos, os erros, os dias de desânimos; e mesmo assim, tinha que ir trabalhar, muitas vezes com gripe, febre, infecções, mas enfim, a batalha foi vencida pelo meu esforço.
Agora terei mais tempo para explorar as virtudes em mim, me conhecer melhor, novos prazeres, viagens, etc... Quem sabe uma nova faculdade? Terei mais tempo para escrever por prazer, criar outras histórias, revisitar as fotos nos arquivos do meu computador, e organizar minhas lembranças. Trazer um jubilar de uma nova etapa em minha vida. Com o “relógio” aposentado poderei fechar os olhos ao crepúsculo.
Mas, nem tudo são flores. Como nada é perfeito na vida, não poderei viver só do valor dessa aposentadoria, o valor está muito aquém das minhas necessidades, mas com outras fontes de renda voltadas em aluguéis, poderei usufruir um pouco da vida que me resta ao lado da minha companheira, compartilhando alegrias com as filhas e netos, minha mãe, e demais familiares.
Agradeço a todas as pessoas que passaram pela minha vida produtiva, que me trouxeram experiências para que agora, com mais calma possa refletir sobre esses erros. Consciente que agora terei administrar algumas coisas, usar menos sal e açúcar, caminhar ao sol, ter mais paciência com os jovens, compreender a natureza e o ser humano, e tolerar a mim mesmo.
Agradeço mais uma vez a todos os companheiros de trabalho, aos familiares, aos poucos amigos, que contribuíram para que eu chegasse à jubilação com o meu corpo saudável e a minha alma íntegra, porque agora posso comemorar e gozar o resto desta vida sendo mais útil e mais companheiro, enfim, viver o lado da vida que é bonita e merecedora.
Peço perdão também a essa tripulação que teve que conviver comigo e com meus erros, por muitas vezes não ter sido paciente, e ainda, por eu não ter sido sábio o suficiente para superar alguns problemas, nem tão inteligente e forte quanto todos mereciam que eu fosse, e por eu não ter feito nada tão genial.
Ao me aposentar estou ciente que não posso atrofiar, já que a vida é dinâmica. Aposentar é fazer de tudo sem obrigação para nada, sem pressa, e ter mais tempo para escolher a prosa e a rima. Aos amigos virtuais e da poesia, deixo um recado para a minha segunda temporada: Aguardem-me! “Não tenho mais hora pra dormir nem para acordar”. Enfim, vou exercer o direito e a satisfação de brincar de viver.
Wagner Ferreira