Extrativista, Quanto Vale a Floresta?
Melgaço, fevereiro de 2014.
Caiu mais uma árvore de angelim vermelho. E o preço dela pago na hora pelo madeireiro foi de 50 reais a árvore. Para o velho piquiá, pagou-se não mais que 30 reais. E se pergunta ao extrativista, ao amazônida, ao brasileiro: quanto vale a floresta?
Se pararmos pra pensar um pouco, tal qual na parábola dos talentos, a sociedade brasileira tem algo valioso que não sabe cuidar. Talvez a maior pobreza da nação seja não reconhecer a riqueza que temos, esvaindo-se ela em balsas de toras que somem pelo rio, levando tudo, não deixando nada.
E como pode um angelim de 10 metros cúbicos de volume ser vendido a 50 reais?! Oficialmente, pelas normas do Pará, seu valor é no mínimo de R$51,12 o metro cúbico da árvore em pé. Ou seja, ao menos R$511,20 vale este indivíduo, patrimônio da floresta pública.
Se explorado e transportado, vá lá, perdendo 30% de seu volume e passando a 7 metros cúbicos aproveitáveis, com valor em tora de R$170,00 o metro cúbico, o valor da árvore exemplo passa a ser de R$1.190,00.
Contra os 50 reais arrematados pelo madeireiro.
Ao considerar que 40% se perde no beneficiamento (passando de 7 metros cúbicos em tora para cerca de 4 m3 de madeira processada), a um valor de R$600 pago pelo mercado pelo metro cúbico serrado, a mesma árvore de angelim chega ao consumidor a um preço de R$2.400,00.
Contra os 50 reais comprados na informalidade e na falta de informação.
Agora, multipliquem esta situação às inúmeras retiradas de madeiras clandestinas em nossa Amazônia. São milhões e milhões de reais furtados dos cidadãos amazônicos por ganância de uns em detrimento de milhares de famílias agroextrativistas. Imagine-se o quanto se perde no avanço do desmatamento. Não se trata apenas de crime ambiental: é crime socioambiental por tirar economia da geração vindoura.
Entretanto, há esperança como sempre no amanhecer do dia. Gente que reconhece, por exemplo, que é melhor investir em frutos de açaí do que decepar palmito sem planejar o futuro. Que faz a conta das mais simples: se um açaizal tem 600 touceiras em 1 hectare, com 2 estipes produtivos no mínimo a produzir cada um meia lata de frutos, recebe ao final a vitória de ter 600 latas por hectare. Disseram-me que no rio Canaticu, Curralinho, em 2011, a média de preços da lata foi de R$10,00. Ora, nada mal termos 6 mil reais por hectare com a valorização de frutos do açaí!
E se cuidássemos da copaíba? Pois seu Pacatuba, lá do Moju, me diz que encontra do tipo vermelha que produz fácil 15 litros de óleo. Se o litro é vendido a 60 reais nos mercados, é mais viável derrubar copaíba pela madeira ou aproveitar o seu medicinal óleo? Neste exemplo, são R$900,00 de três em três anos que se pode ter.
E se contássemos o que tem na mata? Tenho certeza de que teríamos outra postura diante de toda destruição existente. Em 100 hectares inventariados em Portel, estudos do Instituto Floresta Tropical encontram potencial de receita vinda de manejo florestal comunitário em 250 mil reais por ano para madeira em pé, 750 mil reais por ano para madeira em tora e 1,2 milhões de reais por ano em madeira serrada, considerando uma extração de apenas 10 metros cúbicos de madeira por hectare.
Com toda esta possibilidade, não deveriam existir famílias com apenas uma só parede a proteger do frio amazônico. As inúmeras reservas extrativistas, assentamentos agroextrativistas e territórios quilombolas poderiam (aplicando manejo florestal) suprir a necessidade de casas. Então porque não pensar em um Programa de Aquisição de Madeira Manejada para os planos governamentais de habitação rural? Áreas de manejo não faltariam, com certeza. E uma nova forma de renda surgiria.
Mas todas as comparações acima mencionam preço. No entanto, qual o valor da floresta? Quanto vale o clima saudável de uma mata, a escorrer os rios passando pela nossa lembrança de infância? Tem preço a receita da avó nossa servindo piquiá cozido? Quão monetário deve merecer a árvore que convida os bichos ao banquete de suas sementes e frutos?
Diante do aumento do desmatamento e da escalada da extração ilegal de madeira, é moralmente necessário cuidar da floresta e pensá-la como algo sem preço e sim com apreço e valor.
É pra ontem essa urgência, pois o hoje nos preocupa o amanhã.
(Texto utilizado nas oficinas sobre Manejo Florestal Comunitário promovidas pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil – IEB)
Melgaço, fevereiro de 2014.
Caiu mais uma árvore de angelim vermelho. E o preço dela pago na hora pelo madeireiro foi de 50 reais a árvore. Para o velho piquiá, pagou-se não mais que 30 reais. E se pergunta ao extrativista, ao amazônida, ao brasileiro: quanto vale a floresta?
Se pararmos pra pensar um pouco, tal qual na parábola dos talentos, a sociedade brasileira tem algo valioso que não sabe cuidar. Talvez a maior pobreza da nação seja não reconhecer a riqueza que temos, esvaindo-se ela em balsas de toras que somem pelo rio, levando tudo, não deixando nada.
E como pode um angelim de 10 metros cúbicos de volume ser vendido a 50 reais?! Oficialmente, pelas normas do Pará, seu valor é no mínimo de R$51,12 o metro cúbico da árvore em pé. Ou seja, ao menos R$511,20 vale este indivíduo, patrimônio da floresta pública.
Se explorado e transportado, vá lá, perdendo 30% de seu volume e passando a 7 metros cúbicos aproveitáveis, com valor em tora de R$170,00 o metro cúbico, o valor da árvore exemplo passa a ser de R$1.190,00.
Contra os 50 reais arrematados pelo madeireiro.
Ao considerar que 40% se perde no beneficiamento (passando de 7 metros cúbicos em tora para cerca de 4 m3 de madeira processada), a um valor de R$600 pago pelo mercado pelo metro cúbico serrado, a mesma árvore de angelim chega ao consumidor a um preço de R$2.400,00.
Contra os 50 reais comprados na informalidade e na falta de informação.
Agora, multipliquem esta situação às inúmeras retiradas de madeiras clandestinas em nossa Amazônia. São milhões e milhões de reais furtados dos cidadãos amazônicos por ganância de uns em detrimento de milhares de famílias agroextrativistas. Imagine-se o quanto se perde no avanço do desmatamento. Não se trata apenas de crime ambiental: é crime socioambiental por tirar economia da geração vindoura.
Entretanto, há esperança como sempre no amanhecer do dia. Gente que reconhece, por exemplo, que é melhor investir em frutos de açaí do que decepar palmito sem planejar o futuro. Que faz a conta das mais simples: se um açaizal tem 600 touceiras em 1 hectare, com 2 estipes produtivos no mínimo a produzir cada um meia lata de frutos, recebe ao final a vitória de ter 600 latas por hectare. Disseram-me que no rio Canaticu, Curralinho, em 2011, a média de preços da lata foi de R$10,00. Ora, nada mal termos 6 mil reais por hectare com a valorização de frutos do açaí!
E se cuidássemos da copaíba? Pois seu Pacatuba, lá do Moju, me diz que encontra do tipo vermelha que produz fácil 15 litros de óleo. Se o litro é vendido a 60 reais nos mercados, é mais viável derrubar copaíba pela madeira ou aproveitar o seu medicinal óleo? Neste exemplo, são R$900,00 de três em três anos que se pode ter.
E se contássemos o que tem na mata? Tenho certeza de que teríamos outra postura diante de toda destruição existente. Em 100 hectares inventariados em Portel, estudos do Instituto Floresta Tropical encontram potencial de receita vinda de manejo florestal comunitário em 250 mil reais por ano para madeira em pé, 750 mil reais por ano para madeira em tora e 1,2 milhões de reais por ano em madeira serrada, considerando uma extração de apenas 10 metros cúbicos de madeira por hectare.
Com toda esta possibilidade, não deveriam existir famílias com apenas uma só parede a proteger do frio amazônico. As inúmeras reservas extrativistas, assentamentos agroextrativistas e territórios quilombolas poderiam (aplicando manejo florestal) suprir a necessidade de casas. Então porque não pensar em um Programa de Aquisição de Madeira Manejada para os planos governamentais de habitação rural? Áreas de manejo não faltariam, com certeza. E uma nova forma de renda surgiria.
Mas todas as comparações acima mencionam preço. No entanto, qual o valor da floresta? Quanto vale o clima saudável de uma mata, a escorrer os rios passando pela nossa lembrança de infância? Tem preço a receita da avó nossa servindo piquiá cozido? Quão monetário deve merecer a árvore que convida os bichos ao banquete de suas sementes e frutos?
Diante do aumento do desmatamento e da escalada da extração ilegal de madeira, é moralmente necessário cuidar da floresta e pensá-la como algo sem preço e sim com apreço e valor.
É pra ontem essa urgência, pois o hoje nos preocupa o amanhã.
(Texto utilizado nas oficinas sobre Manejo Florestal Comunitário promovidas pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil – IEB)