Carta para os colegas

Carta para os colegas




Prezados colegas,

Venho por meia desta esticar minha indignação até a esfera de vossas influências, lembrando-os de suas habilidades em efetuar mudanças nos campos morfogenéticos (espectros capazes de influenciar o padrão e ou a forma das situações circundantes).

Tenho pois, dito. Ah, sim. Boa noite.

Há pouco o augusto sr. Boechat (da Band) deu aula de Educação Moral e Cívica ao dizer exatamente como estou dizendo agora para o sr. Renato Duque (vide Petrotrevas) o que é o Brasil. No vídeo aparece um mapa do nosso país, todo amarelinho, com um letreiro no centro escrito "Brasil", e o Boechat vai explicando ser um país com 200 milhões de habitantes, 50 milhões de contribuintes, 100 milhões de trabalhadores, nem todos envolvidos em esquemas multimilionarios de sacanear idiotas. O âncora da Band encerra dizendo para o sr.(?) de alcunha Renato Duque que, se ele quiser, pode receber em casa o mapa e as explicações.

Não sei se os colegas sabem, mas circula em meios de estudos midiaticos, já há décadas, as teorias de que tanto o Macartismo quanto a Guerra do Vietnã caíram graças também a esforços de jornalistas corajosos, senão heróicos. Estou me referindo a um país ao norte do nosso, por favor não pensem tratar-se da Guiana (qualquer uma) ou da Venezuela. Mais ao norte. Parece que as coisas lá funcionam. E, de orelhada, lá nunca se ouviu contar de um banzé de tal monta como aqui, onde um é acusado de tungar 600 milhões, outro devolve 200 milhões, um mais tímido devolve (ou diz que devolve) 100 milhões, tem os astutos sombrios que sussurram bilhões, hoje mesmo um ex-presidente negou o roubo de 3 milhões acerca de um negócio de 300 milhões.

Por mais que este assunto pareça cansativo, não nos esqueçamos de que, se em boca fechada não entra mosca, uma boca aberta e falante com um mínimo de direção nas idéias há de servir a uma boa causa não apenas para si própria como para o bem de muitos. Basicamente essa é a idéia da comunicação em tempos de crise.

Caso haja algum colega desacordado digo-lhe em particular que provavelmente você está a xis horas de não encontrar nas prateleiras da mercearia um pote de requeijão ou mesmo um litro de leite. Pelas manhãs os jornais impressos falavam que a greve dos caminhoneiros atingia 7 estados, entretanto agora a noite as emissoras dão conta de 10 estados.

Pela tarde, um dileto colega me enviou um e-mail noticiando que os cérebros no comando da situação pretendem passar uma lei (não sei se entendi direito) atenuando as sentenças atribuídas a todo aquele que lesar o erário. Ora, se eu, ignorante como um parafuso espanado, já senti sobressaltos com a demência desta lei ou emenda, fico pensando no sofrimento daquele entendedor dos mecanismos viscerais que a Máquina se utiliza para continuar sacaneando idiotas.

Não bastasse esse acúmulo de energias negativadas na forma de informações deletérias chegadas ao meu conjunto de sensores neste fevereiro que se esvai feito água em bueiro, as mesmas emissoras dão como favas contadas que os cérebros planejam para qualquer instante um novo pacote de impostos. Ou seja, vão nos colocar de cabeça para baixo e nos sacudir até que caia a última moedinha.

Desejo aos colegas uma boa noite e encerro com uma piadinha cuja serventia será notada pelas crianças das gerações vindouras: um homem chega no psiquiatra com uma fatia de bacon atrás de cada orelha, um colar de abacates em volta do pescoço, uma azeitona em cada nariz e uma antena de TV em cima da cabeça. Ele diz: dr., vim falar sobre o meu irmão.



(Imagem: Máquina de escrever de Octavia Estelle Butler - 1947–2006)
Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 24/02/2015
Reeditado em 15/08/2020
Código do texto: T5149036
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