Carta às amigas recantistas, as poetisas MVA e Joanne.
Prezadas amigas recantistas, fiquei muito feliz com suas visitas e gentis palavras deixadas em minha escrivaninha.
De um simples rasgo de emoção que tive e registrei com o acréscimo dos seus comentários muito pude “pensarsentir” ou “sentirpensar” a partir deles. Voltem sempre e exponho abaixo um extrato do que pensei a partir da interação de vocês duas. Fiquem á vontade para deixar seus comentários, terei o maior prazer em recebê-los. Adoro intertextualidade...
Obrigação como aquilo que impomos a nós mesmos pensando em sermos felizes, em estarmos construindo a própria felicidade, é da ordem do valor, daquilo que acreditamos.
O que constitui a rotina eu não entendo como obrigação, pois que é da ordem da prática: “... cumprir horário, manter um ritmo compatível com o nosso padrão sócio/econômico, idade, cultura, e por aí vai...” (Joanne), nem entendo que precisemos nos desobrigar como libertação da rotina, pois um adulto maduro incorpora a rotina como parte da sua vida físico-biológica que, uma vez incorporada vira ritmo. E como é bom o ritmo da nossa vida! Até os desaventos do dia-a-dia passam a serem sentidos como parte de nós mesmos. E, ai daquele que não fizer esse desdobramento! Quão caro será o preço a pagar a si mesmo.
Porém o binômio/desobrigação é realmente impactante, pois uma vez livre do entendimento da obrigação como rotina cotidiana e da desobrigação como a libertação dessa mesma rotina ou, ainda, o rompimento com a rotina, cujo preço seria “fugir da regra da vida” ele passa a ser uma questão mais ampla para a orientação da própria existência, que é da ordem da autonomia, que nos coloca tantas perguntas.
De onde vêm tais obrigações? De dentro ou de fora?
O que deve – eu mesmo, me “obrigar”?
Que obrigações me impõem que devo – eu mesmo, me desobrigar?
No caso da resposta ser sim para estas questões, de onde tiro as condições necessárias para a realização das minhas decisões?
De onde vêm tais obrigações, pois que muitas obrigações nos são impostas e assim não fazem parte de nós mesmos e, ainda assim, entendemos como nossas e, por isso devem ser desobedecidas?
Se eu percebo a condição acima, onde tirar força para ser fiel a minha coerência pessoal?
Assim, obrigar-se e desobrigar-se ou, mais importante ainda (des)obrigar-se, como não opor-se, simplesmente, mas desconstruir aquilo que de fora se impõe a nós para torná-la coisa outra – outro (s) sentido(s) estes dado por mim e não posto de goela abaixo em nome de uma ordem, pois que a existência é uma arte e como tal tem ética e estética.
Viver é uma experiência que os condicionamentos sociais, culturais..., nos toma de modo tal, que nada nos acontece, por isso é preciso (des) obrigar-se para que a experiência de viver um acontecimento, pois, de outro modo, de que valeria a pena viver?
Abraço fraterno,
Francisca de Assis.