A CARTA

e souza

... Até que ele recebeu a primeira cartinha.

O papel tinha um fundo rosa, com flores nas laterais, havia também laços, uns na cor rosa, outros na cor marrom com pontinhos brancos, em cada folha havia uma menina, uma gravura, em uma delas a menina era loura com um vestidinho rosa, laço vermelho, uma bolsinha rosa com detalhes em rosa e pontinhos brancos. Havia também um gatinho branco de olhos azuis. Um papel típico de uma carta de amor. Um papel para quem envia belas notícias, as que mais se espera. As letrinhas miúdas, eram redondas, bem desenhadas, todas torneadas de paixão, todas bordadas, àquele papel rosa. Letras alinhavadas e cada voltinha lembrava um coração, suas linhas curvas delineavam quase um corpo nu, latente, levemente livre e voador, e sonhador. Cada ponto final iniciava uma estrada, uma reta e uma vida, e cada pausa, uma vírgula, virgulava a respiração e um pensamento naquilo que lia. Lia não economizava nas belas palavras de amor, de paixão e de um só horizonte visto a quatro olhos. Deixava sangrar do peito, sonhos quase utópicos, quase insensatas palavras. Linhas quase intermináveis com musicalidade que Lia não fazia questão de esconder. Era assim feito um poema musicado seguir aquelas linhas desenhadas em um papel rosa claro. Escura aquela madrugada sob a luz da arandela, amarela, clarinha. Clara também mandara uma, em um papel branco, retangular com sonhos, não claros sonhos. A folha era clara, claro que o chama atenção por suas linhas curvas, torneadas nas folhas de outono. Leu e releu, Lia incansável trocava palavras, os sentidos, saltava os sonhos sem quebrar uma só telha, a centelha passava através do amor, cruzava os mares e marés cheias de tanto amor, tanto amar. Omar, recostou-se sonolento no leito, no dorso, no peito, ressonou, adormeceu, alimentou o sonho só. O mundo amanheceu, nasceu e Omar amou mais uma vez o mar.

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