Carta de um amor antigo
Carta de um amor antigo
Escrevo-lhe, senhora, destas longínquas terras de Benguela.
Envio-lhe por escrito o desespero da distância, o sentimento de quem a quer perto, tão perto dentro do peito, mas que me encontro tão longe, tão longe do seu toque, do seu cheiro.
Encontro-me em estado desesperado, numa ânsia sem solução imediata.
Somente esta mensagem traduz o absurdo desespero em que me encontro. Nada mais é necessário. Nem a promessa de amor que fizemos na margem do rio Kwanza, nem a oferta do seu lenço bordado a prometer o beijo nupcial.
Escrevo-lhe para confessar que nenhuma das promessas terá futuro.
A verdade com que nos prometemos um ao outro é a mesma com que confesso a minha partida, o meu não-regresso.
Nesta forma vil de amar ao longe, este sonhar o impossível, este esperar dia a dia, semana a semana...
Decidi, senhora, libertá-la do nosso compromisso. Desejo-lhe que encontre alguém que a ame como eu, mais do que eu. Se esse homem afortunado a amar uma pequena porção do amor que lhe tenho, acredite, senhora, será a mulher mais amada do mundo.
Sinto este dia como o último dos meus dias. Sem Sua Senhoria a minha vida transforma-se num despojo de remorso, de desilusão. Serei um fantasma em vida, porém, na maior ironia que o destino pode condenar um homem, amá-la-ei para sempre. Seguirei os seus passos e celebrarei as suas alegrias. Verei os tons castanhos dos seus cabelos, o seu sorriso de todos os dias.
Hoje, nesta mensagem de despedida, envio-lhe o mais profundo e eterno amor.
Se amanhã, mais uma vez, como em todos os dias que não nos vemos, não tiver coragem de enviar esta mensagem, esta carta, este grito amargurado de amor, saiba, Senhora, que é só resultado de um amor desesperado, devaneio daquele que lhe dedica todo o seu coração e que lhe dedica todo o amor do mundo.
Benguela, aos 04 de Abril de 1888