Meu Caro Amigo

Meu caro amigo,

A vida é justa, ela sempre dá suas voltas, sempre voltando ao ponto de origem.

Sentimentalmente meu ponto de origem foi ter sofrido muito por uma moça, sonhado caminhos juntos e inabaláveis, eis que a vida me pregou uma surpresa, o inabalável se abalou com a força dessa moça. Ai! quisera eu não tê—la amado tanto, quisera ela não ter sido meu primeiro amor.

Perante essa dor eu cai, eu chorei, fugi o máximo que pude. A Bahia me acolheu com facas e beleza.

Me encontrastes anos depois em meu mais puro estado sedutor, indolor, pitoresco, frio e calculista. Abrandei meus sentimentos, me afoguei em paixões súbitas, pagas por hora, afinal, elas tinham fim. Duravam uma noite ou duas. Mas confesso que a dor ainda pulsava uma vez ou outra. A embriagava com doses incontroladas de álcool, cigarros, mulheres, mentiras e uma sedução cafajeste, com a qual eu partia meu coração em pedaços e despedacei infindáveis almas.

O mundo deu voltas, meu caro!

Me perco em momentos solitários, um quarto, sem álcool, sem cigarro, acompanhado de livros, dores e um amor maior que aquele primeiro, carregando espadas no lugar dos punhais que me fatiaram no princípio.

Todos os dias vou do céu ao inferno, sem anestesia, remédios, nem fugas.

Encarando a dor com o maior vislumbre e sentenciando meu coração a ser partido a qualquer momento por navalhas afiadas, belas e audaciosas, das quais não ousarei fugir desta vez.