Para você

Eventualmente, escolho escrever. Mas o formalismo, ah, me deixa cativa de maneira que perco a expressão. É difícil se deixar levar sem se perder em uma parte do caminho. Erros são comuns. Por isso, escrever cartas seja a solução.

Sentada no meu quarto, em frente a um computador, me sinto nostálgica quanto à vida, aos tempos que já passaram. Eu, que ainda em plena juventude já me recordo do passado com pequena melancolia. Tão pouco vivi e já me preocupo com o que deixarei neste mundo, se é que deixarei alguma coisa. Por que haveria de deixar?

Mentir que meu quarto não tem janela seria péssimo. Existe sim uma janela, mas há um muro bem em frente. Velho, sujo, com lodo e telhas quebradas na parte superior, essas telhas que pingam quando chove e o barulho é ótimo para dormir. Agora você está dizendo “coitada, não possui nem uma bela vista pela manhã, uma brisa pela tarde, as estrelas à noite...”. Pobre de mim.

Mentira.

Quando eu deito na minha cama, vejo perfeitamente o céu, entre o muro e minha casa. Uma metáfora? Poderia se ver a perfeição entre seu eu e os limites impostos a ele? Você começou a viajar, eu sabia. Cara, é só um muro, o céu e eu deitada na minha cama.

É difícil escrever uma carta no computador. Eu poderia escrever à mão, mas o cansaço não me deixa. Eu precisava escrever. Mesmo assim, sem a sensação de tocar em uma caneta, ou até, quem sabe, em uma pena como os escritores antigos. Imagina a maravilhosa sensação de mergulhar a pena no tinteiro, colocá-la sobre o papel e deixar-se ir, com uma caligrafia impecável, como uma obra sendo esculpida.

Uma vez me disseram que eu falo demais, digo coisas que não precisam ser faladas. Ora, se eu digo é porque precisam ser ditas e não há como reduzir a necessidade de se dizer. Me sinto como a boneca Emília, sabe, antes e depois de darem as pílulas para ela falar. O silêncio me incomoda. Talvez este seja um dos motivos para escrever cartas. Digo tanta coisa, mas ao mesmo tempo, nada? Não é possível. Algo foi dito, não importa o que ou por quê.

Bom, perdida em pensamentos sem a capacidade de dizer nada coerente além de indagações do setor mais profundo do meu ser, devo dizer que tenho que partir, finalizar isso aqui. Sem noção tudo o que eu disse, entendeu o que eu quis dizer? Talvez não fosse para entender, mas para matutar. Sabe, matutar, de pensar, refletir, como o povo da roça costuma dizer.

Minhas palavras não são feitas para serem engolidas, mas para circularem na boca e serem digeridas em dois estômagos.

Com carinho, até breve...

Nyna