A "BIBLIA" DOS JUDEUS

Carta: 090

Título: A BÍBLIA DOS JUDEUS

Um pastor evangélico solicita informações sobre os nomes

originais dos livros judaicos da Torá.

Quando se estuda as Escrituras com os mestres judaicos, como fiz em 2009 em Jerusalém (École Biblique et Archéologique de Jérusalem – EBAF) há que se ter sempre alguns cuidados. O que para nós é “Bíblia”, para eles é tanakh. É claro que estou me referindo ao Antigo Testamento, uma vez que, por uma questão de estrutura doutrinária, eles ignoram o nosso Novo Testamento.

Tudo começa com o número de livros. Enquanto o cânone (a regra) católico possui quarenta e seis livros, a coletânea dos judeus (no que é acompanhada pelos protestantes) tem livros a menos: ela não registra os livros Judite, Tobias, 1 e 2 Macabeus, Eclesiástico, Baruc e Sabedoria que são encontrados nas nossas Bíblias. São, portanto, sete livros a menos, além de alguns fragmentos (escritos em grego) de Ester (9,20-32) e Daniel (cap. 13-14). Esta diferença tem a ver com aspectos históricos levados a efeito com a reforma de Esdras (430 a.C.).

A outra divergência está na sistematização dos livros. As Bíblias católicas tem seus quarenta e seis livros dispostos em quatro grupos (Pentateuco, Históricos, Sapienciais e Proféticos). Os judeus agruparam seus livros em três compartimentos: Torá (a lei), Nebiim (os profetas) e Ketuwin (os demais escritos). Pentateuco é penta (cinco) e teuxós (rolos). É das iniciais de Torá, Nebiim e Ketuwin sai o acrônimo tanakh. Dentro do cânone católico, os cinco primeiros livros (no Pentateuco) têm nomes em grego e em português: Gênesis (o nascimento), Êxodo (a saída), Levítico (os códigos rituais), Números (o recenseamento) e Deuteronômio (deuterós = segunda + nómos = lei).

Os judeus adotam outro critério para nominar seus livros. Eles não foram buscar nomes em outras línguas, mas utilizam as primeiras palavras de cada volume para designá-los. Assim, o livro do Gênesis é chamado de bereshit, que significa no princípio; ao segundo volume, o Êxodo, os judeus chamam de shemôt, que se refere aos nomes dos filhos de Israel; ao Levítico dão o nome de vaicrá – e chamou –, que narra o chamado de Javé a Moisés, para uma conversa na “tenda da reunião”; o quarto livro, Números, é conhecido entre os hebreus com o nome de bamidbar – no deserto, que explicita o mandato de Deus, no deserto do Sinai, para que Moisés realizasse o censo do povo; por último, o Deuteronômio é chamado de debarim (ou devarim) como as palavras dirigidas por Moisés à assembléia do povo, no outro lado do Jordão.

Dos três conjuntos que compõem a Tanakh (Torá, Nebiim e Ketuwin) a ênfa-se de leitura e oração dos judeus se apoia nos cinco livros da Torá. As preces dos rabinos e demais fiéis junto ao “muro das lamentações” bem como nas sinagogas contempla privilegiadamente textos da bereshit, supervenientemente a shemôt, vaicrá, bamidbar e debarim. A esses livros, por sagrados, devemos respeito e reverência.

o autor é Biblista, Exegeta e Doutor em Teologia Moral