A INSUBORDINAÇÃO; UM DRAMA EXISTENCIAL (uma oração)
Falando com DEUS:
Meu bom Deus!
Cresci com a noção de respeito aos mais velhos e especialmente aos nossos pais. Fui do tempo que umas palmadas, ou umas varadas (verdes) não ultrapassavam o conceito de educação. Entretanto, estou tendo de educar de forma diferente e estou tendo grandes dificuldades. A minha filha mais velha (de 19 anos) é insubordinada, não quer trabalhar, além de tudo arrumou um ‘encosto’ (em vida) que hoje tenho de sustentar para que ela não morra de fome. Por conta disso, tive de acolhê-los em minha casa e assim restringir minha liberdade familiar, porque ambos não merecem minha confiança. Já se meteram até com o consumo de droga.
Já tive oportunidade de colocar os dois sentados à minha frente e conversar horas a fio tentando demonstrar que a vida é exigente. Ninguém pode viver sem trabalhar e sem ter um ofício profissional. Eles até que ouvem e dizem que vão se modificar, mas tudo fica na promessa e não evoluem em nada, pois continuam vadiando e achando que a vida não exige esforços.
Minha filha é daquelas que não luta por nada, a não ser pela sua liberdade de sair e chegar a hora que quiser. Se contrariada nesse princípio ela é capaz de esmurrar. Os xingamentos são coisas que se tornaram corriqueiros embora na sua educação não tenha tido tal exemplo, pois lá em casa ninguém fala palavrão.
Ela estudou nos melhores colégios. Teve todas as oportunidades em que pudesse ser uma pessoa honrada. Não se mostrou útil nem no primeiro emprego. Não trabalhou nem três meses. No segundo emprego eu e minha esposa procuramos encaminhá-la, mas, com a advertência de que teria que começar do zero e, com seu próprio esforço ir crescendo dentro da empresa. Ela largou abandonou esse labor depois de três semanas.
A princípio, como ela dizia que iria voltar a trabalhar eu aluguei uma casa para ela. Aliás, pertíssimo do local onde ela iria desenvolver seu ofício. Sucede que ela ficou apenas dois meses trabalhando. Não quis enfrentar as durezas de um emprego em um supermercado enquanto seu companheiro perambulava e vadiava pela cidade. O sujeito, além de ser inoperante como pessoa ainda reúne certos distúrbios mentais que o levaram a ser rejeitado em alguns empregos. Esse é o menor dos problemas se não fosse usuário de droga. Já foi até preso, mas ao ser julgado foi absolvido em face ao resultado de um laudo que o considerou semi-imputável.
O tal de aluguel que me dispus a pagar foi desfeito porque eles não cumpriram nenhuma das advertências que foram condicionadas com a sustentação daquelas mensalidades. A imobiliária não aceitou tantas reclamações da vizinhança. Minha filha largou o emprego e começou a se envolver com marginais que frequentavam sua residência. A imobiliária, atendendo reclamações dos vizinhos pediu a casa e eu tive de entregá-la depois de eles resistirem por certo tempo naquele imóvel.
Os dois se juntaram com outros jovens que se dizem amigos e passaram a alugar outros imóveis, mas não ficavam nem um mês e os proprietários exigiam a retomada da casa, inclusive dispensando-os das mensalidades em face à tamanha decepção dos respectivos donos. Ou seja, era mais fácil retomar o imóvel do que deixar que a notoriedade do negócio fosse abalada pelas noitadas e frequências indesejáveis tanto à noite como de dia. Para encobrir as torpezas de caráter e as mazelas vivenciadas nessas moradas, tanto eu como a esposa não éramos bem recebidos.
Nosso calvário só estava começando porque naquele primeiro momento a gente tinha feito a doação de fogão, geladeira e móveis para a primeira residência. Com os despejos sucessivos e definitivos, esses móveis tiveram que ficar acumulados em minha casa, enquanto eles ficaram desalojados. A gente (eu e a minha esposa) achava que não devíamos deixá-la desalojada, mas, em contrapartida resistíamos em abrigar seu companheiro (aquele cidadão estranho e que já tinha demonstrado que só a levava para baixo). Resistimos enquanto pudemos. Não há pai e mãe que tendo abrigo, deixe sua filha dormir ao relento. Ela insistia em vir para nossa casa na companhia daquele sujeito. Ficamos uma noite quase sem dormir. Ela ligava a toda hora pedindo para ir dormir somente aquela noite. Já estava quase amanhecendo quando resolvemos ceder. Deixamos que ela seu companheiro dormissem na varanda onde já estavam depositados seus móveis.
No outro dia tivemos uma conversa franca com ela. Novamente aceitou nossas propostas de melhorar de vida. Só que tudo não passou de retórica. No outro dia estava fazendo tudo errado outra vez.
Arrumamos a sua cama em nossa despensa. Lá está ela até hoje e não sabemos o que vai ser daqui pra frente. Todos os dias é uma briga de arrepiar. Palavrões são os pratos do dia. Agora estou tendo de sustentar dois vadios e ainda conviver com brigas horrendas que muitas vezes sobra para nós da família. Meu filho que está estudando às vezes escuta todo a entrevero e reclama como se exigindo que a gente expulse os dois de casa. Mas, como fazer isso?
Mentira é a conversa mais usual que ela exercita. Ontem apareceu com um cachorro enorme que não sei de onde ela tirou. Diz que recebeu de presente. Fiquei transtornado, pois não tem espaço nem pra ela, como acomodar um cachorro daquele tamanho? Então ela veio que a justificativa que iria mudar para um local cedido pelo pai do rapaz. Tudo mentira só para que eu não desalojasse o cachorro. Enfim, o pobre animal (que é bem dócil) não pode pagar pela conduta de uma desequilibrada.
Diante desse drama comecei a entender muitas mães que amarram filhos na cama. Que os deixam presos num quarto. Que muitas vezes vão às últimas em termos de equilíbrio e acabam usando da violência. Num momento de pura adrenalina, em face de tantos abusos, em um dia destes eu a segurei, dando-lhe uma gravata, para que ela não agredisse seu companheiro com algo que pudesse agravar ainda mais a contenda.
Quando ela tem os surtos de violência fica difícil de segurar. Os vizinhos já estão achando que na minha casa só tem loucos. Certo dia a encerrei em um quarto e ela arrebentou a maçaneta da porta de tanto bater com um metal. Parece que ela fica possuída por algum demônio. Contando assim é difícil de acreditar. Só vendo para crer.
Nós estamos numa encruzilhada. Não queremos que o pior aconteça. Sabemos que o nosso abandono e o nosso desprezo vai ocasionar problemas mais sérios porque ela não tem como manter as suas subsistências. Não posso arrumar um trabalho porque ela não admite ficar longe do ‘encosto’ em vida. Ele também não quer trabalhar e encontra facilidade e não obter emprego porque é meio ‘lelé’ da cuca. Os dois não demonstram qualquer vontade de melhorar. Eles só querem, comer, beber e dormir.
Enquanto isso, vamos testando nossa paciência. Eles não ajudam em nada dentro de casa. Não querem lavar nem a louça. Lavar suas roupas, só de mês em mês. Hoje conseguimos que ela fizesse uma faxina na área de serviço onde ela está alojada. Milagre. Talvez com a ajuda dos ‘anjos’ que lá estão por deferência da crença espírita de minha sogra e minha cunhada.
Minha esposa já foi várias semanas no centro espírita para ver se expulsa a entidade que comanda as suas manifestações. Segundo essa doutrina ela está acompanhada de algo maldoso.
Talvez alguém mais radical a expulsasse ou colocasse na rua. Não abrisse o portão quando chegasse. Mas, isso a levaria de volta para a rua. Ela voltaria para o meio mais insólito de sua existência e talvez, no outro dia não tivéssemos mais notícias dela. Como ficaria nossa consciência? Esse é o nosso drama diário...
De outro lado, a gente sabe que morando lá em casa nós evitamos a frequência diária com outros usuários. Ela teve que abolir a presença deles, porque está em nossa casa e enfatizamos que ali eles não vão entrar. Se por acaso eles levarem droga para dentro de minha casa irão responder perante as autoridades, porque não vou admitir essa conduta. Tudo isso está bem observado como forma de suportar suas presenças dentro de nossa casa.
A única coisa que a mantém estável em nossa sociedade é o fato de estar perto de nossa família. Quando isso deixar de existir ela irá para a cadeia ou então será sua despedida do mundo carnal. Ainda estamos tendo paciência e temos esperança que as coisas mudem. Essa é a alavanca que dá ânimo em nossa caminhada.
Pode até ser que nosso zelo seja exagerado perante o pensamento comum. Talvez outras pessoas, com princípios diferentes fossem de abandoná-la ao destino que ela própria escolheu. Mas somos pessoas do bem e não queremos desistir. Quem sabe o senhor, meu bom Deus, colocou esse desafio em nossas mãos como âncora de nossa existência?
Não sabemos onde isso vai dar. Mas queremos que termine bem...