À dor, a você e à memória
Eu sinto falta de você, sim. Até penso em tentar uma reaproximação, mas sempre me vem a angústia, a mágoa. O seu punhal atravessando as minhas costas. Só queria que me dissesse o porquê, o motivo, ainda não consegui (e nem sei se um dia irei) entender. Sei que você andava meio aflita, agoniada, triste também, talvez no calor do momento, uma exaltação... Só queria poder bater em sua porta e perguntar se valeu a pena. Valeu a pena, minha cara? Talvez não, talvez nem faça mais diferença para ti, pequena irmã. Ou então não dizer nada, talvez até contar do livro que li, que vou mal em química, da minha nova descoberta musical e dizer “olha, é a sua cara!”. Meu orgulho tem falado mais alto que tudo, imagino que o mesmo aconteça contigo. Duas crianças orgulhosas, perdidas na madrugada e se alfinetando com textos. A faca da tua traição vai ficar aqui por muito tempo, manterei as feridas abertas, é bom de ver sangrar. Sei que você chorou no começo, e fiquei feliz com isso, confesso. Talvez até pareça exagero ou muito drama de minha parte, mas foi você quem conseguiu quebrar de vez o meu castelo, só escombros agora, mas fique tranquila que a bagunça eu vou limpando pouco a pouco. Você não é assim, sei que pode ser melhor, é uma pessoa grandiosa, mas encarna essa personagem tão baixa pra tentar se esconder, mostre as caras, se liberta, descasca o coração, assim como fez comigo, me abrindo, me revelando, me expondo a todos os perigos, prematuramente. Sonhei que nos encontrávamos na estação Armênia, nos cumprimentávamos como se nada tivesse acontecido, você ia bem, mantinha a ideia de desistir do piano e estava com dificuldades nas aulas de grego. Abraçamos-nos e tchau. Estive pensando, revirando a gaveta de memórias, algumas fotos... Apesar da nossa enorme conexão, sempre nos abraçamos tão pouco. E os poucos abraços sempre foram tão sem jeito. A tal barreira que nos separava, ela vinha de mim ou de você? Sei que já não faz diferença, mas gosto de fingir querer saber, gosto de fingir que ainda faço parte da tua vida. Seríamos dois velhinhos tristes, um rindo do fracasso do outro, mas algumas fatalidades na vida nos levam aceitar que nem tudo é como se pensa. Tudo bem. Mas seria isso aceitação ou conformismo? Todo conformismo é aceitação, mas nem toda aceitação é conformismo, certo? Ou seria vice-versa? Já não sei, meu bem.