Um dia negro para novembro ( a carta do suicida ).
Querido pai:
Não se permita por nenhum momento que caia sobre ti o sentimento da culpa, pois o senhor não possui culpa alguma sobre a minha decisão; esse sempre foi o fim determinado para mim e não se pode evitar o inevitável.
Sei que não tenho o direito de pedir-lhe que não derrame suas lágrimas, não para meu ato de libertação. Sim. Agora eu estou livre, meu pai, agora eu não sinto mais o fardo peso da solidão. Então lhe peço que não sinta culpa, não pensa que o senhor ou alguém, ou até mesmo que Deus, poderiam fazer alguma coisa para mudar a minha decisão. Não posso lhe dizer que eu fui feliz, mas também não posso dizer que eu tive uma vida infeliz, na realidade eu tive muitas coisas boas a minha volta. Tive as oportunidades que muitos não possuem, tive pessoas queridas que se importavam comigo. Eu fui um privilegiado e isso é um fato incontestável. Fui amado pela minha família e amigos, sempre gozei de uma excelente saúde, nunca sofri acidentes e jamais cheguei a conhecer a dor de uma perda. Eu tive os meus momentos alegres, não posso negar, mas a verdade é que simples e puramente eu sempre me senti sozinho. Desde minha infância eu carregava dentro de mim um vazio, meu pai, um vazio que por muitos anos eu não consegui compreender. Porêm há pouco tempo atrás eu descobri a razão desse vazio. Era a ausência do amor, meu pai, a ausência do amor... E eu não soube viver com isso
Com o passar dos anos essa ausência foi me devorando por dentro e nada pude fazer, apesar de eu ter tentando lutar contra isso, mas não se derrota o invisível, meu pai, não se vence a tristeza quando ela foi gerada em seu coração.
Eu descobri que na realidade ninguém é completo e que ninguém é completamente feliz, mas também descobri que não são todos que conseguem conviver com essa realidade, e mau pai, eu fui uma dessas pessoas. Fui um solitário, um solitário da alma e por essa razão lhe digo que o senhor nada poderia ter feito para mudar isso.
Não se condene ao pensar que deveria ter percebido, pois acredite que eu não quis que viesse a perceber, nem o senhor e nem ninguém.
Espero que possa prosseguir a sua vida normalmente, meu pai, desejo que o senhor continue feliz e cheio da alegria que sempre o vi ter e não veja o meu ato como uma tragédia, eu agora estou livre, encontrei a cura para o veneno que estava me matando aos poucos.
Eu o amei muito, meu pai, com todo o meu coração e sempre tive muito orgulho de ouvi-lo me chamar de filho. Peço que possa um dia me perdoar pela minha decisão e se após ter lido essa carta e não veio a compreender eu espero que um dia venha, pois não quero ser a causa se seu tormento.
Diga a todos que também os amei muito e que não tinha também como perceberem o que estava acontecendo comigo, pois isso sempre me acompanhou a minha vida inteira.
Adeus, meu pai.
Seu filho.