PERDAS E AFAGOS

(para La Bella Peregrina, a propósito da perda de seu avô)

Tesouro lindo de meu jardim virtual! Voltei, depois de umas longas férias longe dos meus, de ti, do entorno dos desconhecidos íntimos que nos acercam, nas Letras.

Deixo aqui o abraço carinhoso nesta hora difícil, a das perdas. Vivemos neste fio de linha entre o nascer e o morrer. Equilibramo-nos na corda bamba, temerosos dos ventos. Nascer já é passado, o futuro é a certeza do passamento.

Feliz de quem cumpre a sua meta, ou chega perto dela. O tempo é tão curto pra se fazer tudo. Morte é ruim pra quem fica. Um buraco sem fim, obscuro e insípido.

Ficamos somente com a versão dos que estão vivos, condenados ao esquecimento diuturno. Porque nós é que temos o amor na memória. Nos passados para a outra margem, a vida o exauriu pelo exercício do viver.

Os que partem não soluçam. Ao menos não vemos o seu eventual choro, porque, ao que tudo indica, ocorre a libertação desta carcaça de ossos e carnes como um boitatá perdido no meio do campo, por entre o verão e o lusco-fusco de fim de tarde.

Não temos notícia da outra margem, tudo é mutismo, silêncio de lápide de jazigo. Rememora-se o feito e os ditos. São estas flores que importam para os registros.

Ruminamos a posse dos momentos. O imaterial que se agregou em nós qual uma "craca" se apega às pedras e madeiras dentro d'água. Caramujamos sem carapaças.

A História é o Grande Nada para quem soube ser anônimo... O que faz feliz é que sabemos das limitações do ser e se intui o futuro como uma máscara de ferro.

Ó memória viva, perdoai o que em nós não presta! Animai a volta ao reino dos granículos de pó!

Fechai os meus pobres olhos para que a dor não roube a alma e o juízo. Amém!

– Do livro CONFESSIONÁRIO – Diálogos entre a Prosa e a Poesia, 2006 / 2007.

http://www.recantodasletras.com.br/cartas/428809