Maria

Querida Maria;

Não sei com estará quando ler esta minha carta, provavelmente linda e fresca como sempre esteve. Minha querida princesa, quando lembro dos grandes momentos que passamos juntos, me dá uma saudade do passado, ainda fresco na memória, do seu cheiro, ainda vivo nas minhas roupas.

O cavaleiro negro está todo eriçado hoje, parece que o dia está arrebentando de viver, deve ser um dia daqueles para se tomar um banho de mar. Lembre-se de sua promessa de cantar”loirinha sereia” da próxima vez que ver o mar, e pense em mim voando nas asas de um azulão. Deve ser lindo existir no mundo.

A mamãe não está muito feliz, mas ela quer me convencer do contrario, ela é tão frágil, se não sou eu, o seu reizinho, ela não se agüentaria. Coitada, parece estar mais presa do que eu, parece a luz de uma vela prestes a se apagar.

Hoje me arrebentei de rir, dias de sol é sempre tão felizes. Uma mosca entrou aqui no quarto, ela voava como se fosse a mamãe andando no escuro a procura de fósforo, eu rachei de rir, queria que você estivesse aqui. A coitada estava como se louca, não tinha direção, parecia cega.

O Azulão voa assim? Deve de dar muito medo.

Ela se batia toda na janela, queria passar por um buraco, por conta da luz que vinha de fora. Eu também queria muito sair, mas não tenho coragem de socar minha cabeça assim contra a janela.

Rir muito tive até dor de barriga, as moscas são tão engraçadas, você já viu elas coçando? Elas se equilibram nas duas patinhas da frente e esfregam as de trás, e como são rápidas, nunca consigo pegar uma, estão sempre vigilantes. Elas são muito talentosas, mas não para passarem pelo buraco da janela, deve ser gostoso brinca de cobra cega com elas. Pena que elas não são gente, se tudo fosse gente seria bom, não seria? Poder brincar com as moscas, conversar com a lua, talvez pudéssemos até se pendurar em um rabo de largatixa, não seria legal? Iríamos ter tanta coisa para fazer que nem iríamos querer sair do quarto, ficaríamos vivendo esse encanto, você e eu, seríamos os rei de um mundo só da gente.

Lembra-se daquele dia em que uma borboleta pousou na sua testa? Que maravilha! Não foi? Pois hoje eu vi uma, até mais bonita, mas ela não quis pousar em mim, e quando eu digo que você é muito mais bonita do que eu você não concorda, até as borboletas acham, e eu também. Mas não fiquei triste, foi tão bom vê-la, você já cheirou uma borboleta? Como será que elas cheiram? Eu nunca cheirei uma, tem tantas coisas que eu ainda queria fazer, elas devem ser perfumadas, como você.

A borboleta ficou pouco tempo aqui no meu quarto, mas foi bom, senão não conseguiria escrever, você sabe que não consigo perder um vôo de borboleta, é mais bonito do que o do cavaleiro negro, ele se delicia com o vôo, da vontade de voar também, mas acho que as borboletas aproveitam mais, você já reparou que elas até dançam quando voam? Será que elas também ouvem alguma música quando voam?

Eu queria me concentrar mais, mas hoje minha mente está tão dispersa, tem tantas coisas lindas acontecendo em minha volta. O cavaleiro nego está coçando com o bico por debaixo das asas, como adoro isso! Será que o pescoço dele não dói mesmo? Você disse que não, mas ainda duvido.

Ainda não sei se quero que esta carta seja o ultimo de tudo que houve entre nós, mas ela é o presente do pretérito, não é como as outras, é para ser guardada.

Desculpe-me por nosso conto de fadas está às avessas, no fim o príncipe irá partir e a princesa ficará só, para quem sabe arrumar um outro príncipe e continuar a sua vida. Quando me dei conta de que o fim estava próximo só consegui pensar em nós dois. Desculpe se depois do beijo não me transformei em coisa melhor.

Te amo!

Bernardo.

Cobalto
Enviado por Cobalto em 13/03/2007
Código do texto: T410966