Sobre o teu queixo no meu ombro:
Eu nunca imaginei como eu chegaria até a tua frente. Sem traçar caminhos, me interessava apenas pelos teus lábios já entre abertos se aproximando dos meus ou pela tua respiração calma no meu rosto, as tuas pálpebras se encolhendo revelando um olhar perdido nos cantos do cenário e por aquele silêncio esperando para ser quebrado, as nossas carícias se refazendo aos poucos. Flagrei-me em pensamento muitas vezes encaixada no teu abraço, olhando para o sentido da rua que vai e pensando em ti que preso a mim observa os carros que voltam. Nunca consegui montar diálogos, jamais sabia o que dizer ou em que tom as palavras respondidas chegariam em mim, então prendendo-as no silêncio como culpadas da falta de sequência dos nossos momentos, eu nos deixava ser na quietude. Descrevendo o que sinto assim parece que eu só queria o teu corpo de interior desconhecido perto do meu e nada mais, mas é esse desejo por nós dois parando nossas duas existências para apenas permanecer, sem travessões riscados e reticências pingada que prova o meu querer te descobrir.
Queria poder descrever exatamente como tudo foi acontecendo, passo a passo, não para tentar repetir como se fosse uma receita, para poder nos assistir do lado de fora da recordação e saber pequenos detalhes que o impacto do encontro ofuscou. Da saudade sobra a certeza de ter sido e a dúvida de nunca mais ser como se eu fosse acordar e não seguir, sendo obrigada ficar na cama até amanhecer tentando entender o efeito de alguém que não existe. Eu não quero te inventar porque os teus olhos já me são sete ou oito doses de veneno, nove ou dez comprimidos e um tiro, só para garantir, na boca do meu vazio.