Querido Papai Noel,

Pra ser sincera, querido soa um tanto pejorativo, mas estou apenas seguindo os padrões. Sabe como é, a gente muda uma coisinha aqui e ali, quer fazer uma diferença lá e cá, e a sociedade já cai em cima. Então, entenda, estou apenas seguindo os padrões...

Queria... Hmmmm... Espera! Queria é o correto? Esse vício de um pretérito imperfeito... Se é imperfeito, não é certo. E essa incerteza me proporciona confusão, uma vez que não sei se o que pretendo pedir é o que realmente quero ou apenas o que gostaria de querer. Entende essa minha confusão linguística-filosófica, Sr. Papai Noel?

Ok, sei que estou enrolando pra dizer o que, de fato, pretendo expor nesta carta, mas é que nos exigem tanto a perfeição com as palavras, com os tempos verbais, com as concordâncias, com as regências, com os pronomes de tratamento, com toda esse novo acordo ortográfico (aliás, desconsidere minhas palavras escritas de forma inapropriada, é que meu programa de correção de textos anda meio desatualizado... Aliás, se temos o programa de correção, pra que nos preocuparmos em saber o resto?). Enfim, é tanta cobrança que, quando escrevo meu próprio nome eu fico na dúvida se está certo ou errado.

É, eu sei, você já deve estar de saco cheio (digo, senhor, é que... né? Barba branca, essa sua vida milenar... Esse é o nosso pronome de tratamento: Senhor. Desculpa aí, bom velhinho). Aliás, seu saco deve estar sempre cheio nessa época do ano. Milhões de presentes encomendados pelas criancinhas que lhe escrevem cartas tão bonitinhas, mimadinhas, cheias de pedidos (com o nosso famoso QUERIA, onde cai a sua dúvida, né Papai Noel? E o senhor acaba dando uns presentes diferentes dos pedidos. O Joãozinho, por exemplo, que pediu a bicicleta do Batman já tem 23 anos e não recebeu até hoje. Vai ver foi mesmo o QUERIA ou então a carta ainda não chegou... Vai saber).

A esse ponto o senhor já deve ter me chingado de todas as coisas, porque o fiz ler uns 4 parágrafos e nada disse, ainda. E deve ter ficado ainda mais bravo... Sabe como é, não Chingamos, mas Xingamos as coisas, ou as pessoas. Tanto faz. Mas... Papai Noel? Papai Noel xinga também? Mesmo que seja pedir demais, espero que o senhor não fique bravo comigo. Ensinaram-me que, para um bom trabalho acadêmico, temos que escrever muito; precisamos preencher muitas folhas, mesmo que sejamos redundantes. Fiquei com isso na cabeça, agora. Mas... Vai, sejamos francos, Papai Noel, nem tudo que tem tamanho tem importância. Aliás, resumo um artigo científico em uma folha: A introdução e a conclusão. Só que... São os padrões. Sabe, a nossa amiga ABNT.

Então, neste momento acho que já perdi o foco da minha carta e o senhor já deve estar pensando em quantos pedaços picotá-la. Talvez também esteja cogitando a ideia de colocar meu nome numa dessas esquinas da vida, pra ver se eu tomo jeito. Isso se o senhor não for mesmo o bom velhinho. Mas, Papai Noel, como te disse, a culpa não é minha: são os padrões exigidos pela sociedade.

No fim, Sr., o meu QUERIA teve uma força tão grande que eu só realmente quis te escrever uma carta, mas acabei não escrevendo nada. É isso. Espero que tenha um Natal repleto de realizações e que o menino Jesus preencha seu coração e lhe traga boas mudanças (é, eu sei, tenho que seguir esse clichê social, caso o senhor ache que foi falta de educação da minha parte não desejar um Feliz Natal)

Ah! Mas tenho uma boa notícia, Sr. Papai Noel, se no fim das contas essa carta só chegar no dia 22, 23, 24 ou mesmo no dia 25 de dezembro de 2012, talvez o senhor nem tenha se dado ao trabalho de lê-la, porque, até lá, vai saber, o mundo pode ter acabado.

Com carinho, Jessica (Ops! Jéssica, lembrando que toda proparoxítona é acentuada)

Por Jéssica França
Enviado por Por Jéssica França em 18/12/2012
Reeditado em 18/12/2012
Código do texto: T4041594
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