Luz no Calabouço

Vejo que ainda sonhas e que mesmo que eu não possa tocar teu sonho eu sei, ele está lá... ele existe e faz parte de toda sua vida. Essa certeza alenta de alegria meu coração, porque sonhar faz viver com felicidade. Então eu sei: és feliz, como eu sempre desejei que fosse. Queria tanto poder lhe dizer isso, mas, como sempre, por medo, achei melhor deixar a rosa do coração acenar suas pétalas só para dentro de mim. Por isso, mergulhei nas águas de silêncio e finquei ali minhas raízes. Como um passarinho, que se enrola em suas próprias asas para se proteger do frio e da chuva, antes mesmo de começar a chover. Talvez por medo de que uma tempestade venha e aniquile seus sonhos outra vez. Como eu, ele não suportaria morrer novamente. E mesmo que digam que o medo anuncia uma morte que não vem, eu sei, ela poderia vir... e, dói muito descobrir se ela é real ou não. E você sabe. Já experimentei duas vezes essa morte e sei como é. Por isso posso falar. Sabe, me perguntaram como é ser passarinho sem voar pelos campos e montanhas preferidos. Respondi que é como morar num calabouço, sempre na escuridão, sem ver a luz do sol. Mesmo sabendo que ele brilha em algum lugar... não poder vê-lo e sofrer por não ter seu toque de luz e calor. Então me perguntaram como eu poderia saber que o sol brilha se vivo na escuridão. Em minha reflexão, disse que com o tempo não há mais como reconhecer as cores de sua luz, mas que sinto que ela está lá e brilha suas cores para alguém. Então, lembrei da mulher cega que um dia podia ver. Ela podia ver a vida com seus olhos. Agora, cega, ela diz que não vê mais em cores. Só vê cinza. Ela não tem mais a memória das cores. Não consegue imaginar, embora saiba que o vermelho é vibrante. Ela tem o sentimento de quando via o vermelho, de que ele era vibrante e sente a emoção que isso lhe causava, mas, não sabe mais como ele é. Viver no calabouço é assim. Você vai perdendo as cores de teus sonhos. Embora continue sentindo a emoção delas. Os sentimentos se aquietam, vão ficando cinzas também, mas, continuam lá... Então quando alguém chacoalha as correntes dos grilhões... dói sempre de novo... dói tudo outra vez... porque você sabe que não pode mais ver. Sabe que não pode mais tocar o que tua alma tocava... Hoje, alguém chacoalhou essas correntes e eu percebi, de novo, que vivo na escuridão, mesmo sentindo o toque da lua branca iluminando o dorso da montanha na escuridão. Sabe, existe uma lei que determina os caminhos do sol, da lua. E, é essa lei que determina que o sol navega o dia em esplendor e a lua vaga solitária na noite de estrelas. Por isso, não há como sol e lua se abraçarem, eles não se encontram no espaço sideral. E, quando se encontram no céu, a lua está de um lado do mundo e o sol sempre do outro. Eu sei. Existem passarinhos que continuam de asas abertas, voando os sonhos pelas nuvens. E eu também sei: não posso mais voar, nenhuma palavra, porque minhas asas se recolheram ao redor de meu coração... para protegê-lo da dor de não mais tê-las a voar... Mas, eu sei. Você ainda voa. Ainda sonha... E isso alenta luz para os calabouços escuros da minha vida...

A Montanha Azul
Enviado por A Montanha Azul em 22/11/2012
Reeditado em 22/11/2012
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