Meu caro amigo, a vastidão do desejo está disfarçada de horizonte.

Entardecer na vida é como ter feito uma corrida de obstáculos sabendo de antemão que não venceria da mesma forma toda gente. Tudo que existe é um imenso vazio que chamamos de Universo, nossos órgãos são formados de células e essas mínimas estruturas de vida se relacionam em um caos harmônio em ritmo acelerado.

Em toda parte, e nas altas temperaturas do labor, milhares de pessoas se esforçam para que as estruturas que os alicerçam sejam suficientes para trazer segurança aos filhos. Poucos entre nós podem erguer seus narizes ao alto para respirar do ar do futuro que cada um idealiza.

Sinto que entardeço do modo como as frutas são vistas no pomar, na hora certa da mangueira, na hora certa da figueira, no exato instante em que o limoeiro deixa no ar o sinal de sua maturidade - então tudo cheira à flores de laranjeiras. Tudo é quimera, construção e vazio entre colunas cobertas de telhados de vidro.

Vez ou outra uma demolição. Uma casa que vai abaixo e os construtores ali se juntam para decidir sensibilizados pelo aroma da tarde carregado de melissa e cabeça de velho.

Meu amigo, eu entardeço. Minha vida entardece e não tenho mais pressa.