Estávamos em férias ... continuação 21a. carta "1o. dia na UTI"
No dia seguinte cheguei cedo no hospital e o médico autorizou-me entrar na UTI. Era um médico amigo do meu filho, irmão de um “adotadinho”. É, estávamos em Cuiabá.
Ele me falou que não tinha acreditado na explicação das manchas vermelhas e que ficou observando para ver se iriam sumir mesmo. O meu medo era pensarem que se tratava de uma reação alérgica ou algo assim. Após virarem o Róger de lado na cama, aos poucos a pele dele normalizava. E ele falou: “não é que a mãe dele tinha razão!”.
Tadinho do meu filhão, não cabia direito na cama. Os pés dele ficavam pressionados pela travessa da cama. A primeira noite na UTI de um hospital em Cuiabá. Estava recebendo alta para ir para o quarto normal do hospital. Só que não tinha vaga. Havia muitas pessoas esperando vaga para entrar na UTI e outras esperando vaga para ir para os quartos.
Quando teve vaga foi transferido para uma ala de pós-cirurgia. Uma ala que as pessoas iam embora mais rápido do hospital. E também uma ala que o risco de infecção era menor, segundo a própria equipe.
Os primeiros dias de adaptação. Meu marido ainda não tinha voltado de SP. Conhecer a nova equipe da clínica médica, neurológica, fisioterapia, nutricional, fonoaudiologia, enfermagem. A partir da prescrição médica do hospital de SP a equipe daqui também prescreveu a medicação.
Eu estava me adaptando a rotina do hospital. Aqui tinha somente uma pia na entrada do andar para lavar as mãos. Toda família foi orientada para que as mãos fossem bem lavadas e que na entrada do quarto havia um dispositivo com álcool gel para ser usado antes de entrar no quarto.
Imaginem os olhares da equipe do hospital e os cochichos rolavam: “será que a frase dita de ouvido a ouvido era mais ou menos assim: a mãe e o pai do paciente do quarto x são muitoooo chatossss”?
Inicialmente uma das rotinas que mais me agoniou foi o contato do paciente com o corpo de profissionais. Para levar o Róger para a poltrona do quarto eram solicitados dois “maqueiros”, rapazes que carregavam os pacientes no hospital inteiro. Os rapazes chegavam e pegaram o “meu guri”, abraçando-o e carregando-o para a poltrona.
Meu coração disparava, cadê a pia? Será que lavaram as mãos? Será que esses meninos carregaram alguém saudável? O meu Deus! Estavam em um hospital e as pessoas que carregavam eram pacientes dos quartos, das cirurgias, do pronto atendimento. Minha cabeça ficava a mil por hora.
Comecei a observar e vi que eles não lavavam as mãos, que saiam de um quarto e entravam no outro normalmente. O que eu devia fazer?
Gentilmente, passei a oferecer-lhes luvas para colocarem. Dava um sorriso e oferecia a caixa de luvas. Um ou outro já usava luva. Só que a minha duvida era se a luva era trocada a cada quarto ou se a mesma luva voltava para o bolso da sua roupa para ser jogada no lixo ao final do plantão.
Exagero da minha parte? Pode ser que sim! Só que eu não estava disposta a correr mais riscos. A adaptação à cultura da minha cidade foi cheia de ansiedade.
E aos poucos fui ampliando esses cuidados, com a equipe toda. Passei a oferecer a caixa de luvas para todos, como se fosse um docinho de recepção. A maioria entendia e passava a seguir como padrão. Depois me confirmaram que o hospital tinha capotes, uma espécie de jaleco com material esterilizado e que os profissionais deveriam usar. Sabiam que para pegar no meu filho tinham que usar capote de proteção, caso andassem pelo hospital inteiro e luvas. Sintomas de gripe? Não tinha dúvida, oferecia uma máscara. Ou dispensava, gentilmente, o atendimento daquela pessoa.
Na verdade percebi que usavam porque a família exigia. E a possibilidade de infecção hospitalar? Só existia para o meu filho? E quando as famílias não sabiam disso? E...? perguntas não paravam e não param de passar pela minha cabeça. Aliás, um dos meus objetivos de compartilhar estas histórias e levar alguma informação para famílias que porventura estejam precisando.
Os dias se passaram. Meu marido chegou. A rotina de hospital continuou com a nossa interferência. A gente caminhava pelos corredores e sentia o olhar de reprovação? de insatisfação? ou de outro sentimento... e os médicos resolveram solicitar internação em Home Care.
Ficamos dias no hospital, prontos para ir para casa esperando a rotina burocrática do convênio. Estava sendo selecionada uma empresa prestadora de serviço de Home Care. Eu nem sabia que isso existia. E tinha algumas empresas, graças a Deus! As empresas foram ao hospital avaliar a condição do paciente para apresentar a proposta ao nosso convênio. Dias se passaram nesse tramite.
E nós esperávamos confinados ao quarto do hospital. Todos os dias a gente perguntava para a equipe médica que passava a visita se o Róger poderia tomar banho no chuveiro, ou se poderia dar uma volta pelo corredor, ou para sair um pouco do quarto e tomar um banho de sol. A princípio a resposta era para esperar mais um pouco, logo iríamos para casa. Para que expor o paciente aos bichinhos de um hospital? E nós aumentávamos os cuidados, pois se havia bichinhos lá fora, tínhamos que impedir a entrada no quarto. E pelo nosso entendimento, só poderiam entrar pelas mãos dos profissionais que não lavavam as mãos ou pelas roupas contaminadas durante o dia de trabalho, ou pelas bandejas de remédio colocadas tão naturalmente em todos leitos do hospital pelos técnicos e enfermeiros.
Ai meu Deus! Havia portas de entrada demais! E nós queríamos os bichinhos longe dali.